quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Viva a Ópera (7)

A Roda da Fortuna nos codex dos Carmina Burana

Hoje conversava com um amigo sobre as eleições.

Papo vai, papo vem e a música aparece. Primeiro a Fortuna, Imperatrix Mundi.


O Fortuna,Ó Fortuna,
Velut LunaÉs como a Lua
Statu variabilis,Mutável,
Semper crescisSempre aumentas
Aut decrescis;Ou diminuis;
Vita detestabilisA detestável vida
Nunc obduratOra oprime
Et tunc curatE ora cura
Ludo mentis aciem,Para brincar com a mente;
Egestatem,Miséria,
PotestatemPoder,
Dissolvit ut glaciem.Ela os funde como gelo.


Carmina Burana, a cantata tão popular nos lembrando da inexorável Roda da Fortuna. O giro interminável que deveria servir de lição a todos. Ora boa sorte, ora má sorte, ora em cima, ora embaixo. Como conseguir o equilíbrio em tudo isto? É impossível evitar que a Imperatrix Mundi brinque com nossa mente.

Para as óperas foi um pulo. Otelo, Nabuco, as intrigas palacianas, a ascensão e queda motivada pela mesquinhês, pela inveja, medo. Shakespeare e a natureza humana toda ali revelada, com seu comportamento tão previsível.

A cada vez mais a Cultura nos pareceu essencial para dar ao homem o balizamento para sua vida e decisões. É impossível evitar que a Imperatrix Mundi brinque com nossa mente. 

Egestatem., Potestatem: Dissolvit ut glaciem.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Carlos Gomes no mapa do Brasil (26)


Fíéis do Círio de Nazaré  e a "Corda"
Belém - Pará

Hoje em Portugal, na cidade de Nazaré, acontece a festa do Círio, provavelmente a mais popular das festividades do culto mariano. Também em Saquarema, no Estado do Rio, a procissão do Círio de Nazaré - a mais antiga do Brasil - se realiza nesta data.

Mas é no domingo dia 10 (segundo domingo do mês) que o Brasil comemora em Belém - Estado do Pará - a maior manifestação religiosa católica do mundo.

O Círio, como chamam no Pará, tem "vela" como significado etmológico. E de fato as velas, sejam aquelas verticais, algumas do tamanho das pessoas, ou as que reproduzem partes do corpo humano ("ex-voto" do latim ex-voto sucepto, o voto realizado, o pedido) são uma das tradições do Círio. Em Belém, a festa religiosa torna-se multicolorida pelos inúmeros símbolos que lhe são agregados.

É no Círio que os paraenses recebem seus amigos, trocam presentes, fazem votos de futuro promissor e se reúnem nas casas em torno de pratos típicos não faltando às mesas o  delicioso pato no tucupi com arroz branco e a saborosa (e forte) maniçoba, iguaria sem similar no cardápio nacional.

Para quem vai ao Pará - a Belém - no Círio saltam aos olhos os Brinquedos de Miriti, objetos feitos do caule da palmeira conhecida como Miriti ou Buriti reproduzindo desde figuras da flora e fauna, como objetos do dia a dia (televisão, avião, carros etc.) ou grupos de pessoas desenvolvendo atividades cotidianas ou folclóricas (dançarinos, médico e pacientes etc.). Infelizmente esgotada para compra, é possível encontrar nas principais blibliotecas brasileiras o livro Brasil das Artes, onde é documentada por Luiz Braga, fotógrafo paraense, todo o processo de confecção dos brinquedos, da coleta da matéria prima à sua comercialização no Círio. O livro é resuldado de um trabalho de pesquisa nacional da historiadora e curadora Rosana Caramaschi, editado em dois volumes, com várias outras manifestações da arte popular, sempre sob a ótica de um fotógrafo representativo no Brasil.

A História do Círio de Nazaré no Pará começou por volta de 1700, quando, segundo a lenda, o caboclo Plácido, descendente de portugueses, caminhava nas proximidades do igarapé Murutucu (onde hoje fica os fundos da Basílica de Nazaré) e encontrou uma pequena imagem de madeira que reproduzia Nossa Senhora de Nazaré e era uma réplica da que existia em Portugal. Deste achado à construção de uma ermida e mais tarde a própria Basílica, registram-se inúmeros fatos místicos que vieram a reforçar a força da fé e religiosidade que a Senhora de Nazaré provoca.

É nesta cidade impregnada de fé e valores culturais que se encontra também uma Rua Carlos Gomes, próxima ao Theatro da Paz.

Nestes dias de comemoração do Círio em nome dos amigos Benedito Nunes, Maria Sylvia, Paulo Chaves, Gabriel Chaves, Gilberto e Lilian, Ney Messias, registro meu apreço ao povo paraense, desejando que as festividades sirvam de reflexão sobre a fraternidade, igualdade, liberdade de expressão e que se possa avançar para um Estado socialmente mais justo, culturalmente ainda mais expressivo e em paz sob as graças da Senhora de Nazaré.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Viva a Ópera (6)


Le Moulin de la Galette -
Lautrec

A ópera em São Paulo ainda está caminhando a passos lentos. Promessas viris à frente.

A melhor coisa por enquanto é encontrar os amigos nas estréias e a conversa em torno do espetáculo. É muito bom.

Com a mania de Twitter o texto hoje ficou curtinho. Mas é tarde. Hora de descansar e cuidar da saúde.


quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Viva a Ópera (5)


Hoje é dia de Norma, no Theatro São Pedro.


Norma é uma ópera deliciosa e cheia de "pegadinhas" para o diretor. Muito bom revê-la ao vivo, pois esta será uma noite cheia de lembranças de quando a dirigi com a regência de Patrick Shelley, do Howard Lloyd com quem trabalhei outras vezes, do teatro em Sherborne na Inglaterra, o coro, Tim Lee, Karyne Babajanyan, Mikail Milanov, do Gilberto Chaves, tantas pessoas...

Na foto, Denise Heywood, Alice Meno, Mauro Wrona (Flávio), Rosana Caramaschi, Eduardo Meireles. Foi divertido e gostoso de fazer.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Carlos Gomes no mapa do Brasil (25)

Ponte da Amizade
Foz do Iguaçu - Ciudad del Este

Na semana em que o Presidente Lugo, do Paraguai, veio ao Brasil para internar-se e tratar de um problema linfático, lembrei que em Foz do Iguaçu, há menos de 1 km da Ponte da Amizade que une os dois países, de Foz do Iguaçu a Ciudad Del Este, sobre o rio Paraná, está a Avenida Carlos Gomes.

A Avenida Carlos Gomes está num bairro densamente ocupado e Juscelino, Fagundes Varela, Oswaldo Cruz, Assis Brasil e José do Patrocínio são apenas alguns dos nomes de brasileiros ilustres que lhe fazem companhia.

Nota de Rodapé (7)


O André Vargas, Secretário de Comunicação do PT, está errado ao acusar o Serra de anticristão por causa da pílula do dia seguinte que ele introduziu na rede pública. Pessoalmente, reiteradas vezes, o Serra já disse ser contra o aborto, mas como homem público não pode deixar de pensar no problema social relativo.

Aborto é uma questão complexa de saúde pública. Da mesma maneira, a educação para prevenção é uma necessidade concreta para a saúde da mulher.

Ser a favor de soluções que preservem a saúde é uma questão de tolerância das circunstâncias individuais que afinal são o que levam a esta ou aquela decisão. O processo democrático é um exercício permanente de convvivência de opiniões contrárias.

Muito embora se diga que a Dilma perdeu votos por ser a favor do aborto é mais provável que tenha sido por apresentar-se com opiniões diferentes sobre o mesmo assunto em tão pouco tempo. Alguém pode ser contra o aborto e a favor de uma lei que preserve a saúde da mulher, uma vez que a questão extrapola as fronteiras da religião. No caso em questão parece ser mais claro que a candidata muda de ideías conforme a necessidade e as circunstâncias o que se tratando de um tema polêmico e grave é fatal.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (41)

da série - O que vi pela TV-1999
Siron Franco

Quem acompanha o blog sabe que de um modo ou de outro sempre venho apontando questões como investimento na Cultura e Sustentabilidade Ambiental como prioridades e desafios econômicos do futuro Brasil (digamos futuro desta maneira, em minúsculas, para garantir que não estou falando do "país do futuro" ou de futuro como uma coisa tecnológica, robótica ou coisa parecida). Este futuro a que me refiro é o daqui a pouco, aquele que está ali na próxima curva da História, dependendo de nós mesmos a velocidade - a marcha engatada - com que entraremos nela. Mas, vejamos os dados e ponderações seguintes:

O artigo 6º da Constituição de 88, no que diz respeito aos Direitos Sociais tem a seguinte redação:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Esta redação assim foi expressa pela Emenda Constitucional nº 64, de 2010  (incluiu alimentação).

O artigo 215, por sua vez, diz que O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais. Ao definir patrimônio cultural brasileiro, de forma indireta, a Constituição aponta como direitos culturais as formas de expressão, os modos de criar, fazer e viver, as criações científicas, artísticas e tecnológicas. O livre exercício dos cultos religiosos, a livre expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, e os direitos do autor também estão expressamente assegurados na Constituição, no rol dos direitos e garantias fundamentais (art. 5º).

A Educação por sua vez figura como Direito Cultural (ver artigos de 205 a 214) sendo expressamente garantido o  acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um o que significa a garantia de alfabetização para as artes e educação para a prática artística, que tenho citado como os principais entraves para o consumo da chamada Cultura erudita, somado à falta de acesso a programas específicos de formação.
 
Os direitos culturais são parte integrante dos direitos humanos. Estão indicados no artigo 27 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), e nos artigos 13 e 15 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966).
 
Assim, todas as pessoas devem poder se exprimir, criar e difundir seus trabalhos no idioma de sua preferência e, em particular, na língua materna; todas as pessoas têm o direito a uma educação e uma formação de qualidade que respeitem plenamente a sua identidade cultural; todas as pessoas devem poder participar da vida cultural de sua escolha e exercer suas próprias práticas culturais, desfrutar o progresso científico e suas aplicações, beneficiar-se da proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de toda a produção científica, literária ou artística de que sejam autoras.
 
Em 1988, é assinado o protocolo de São Salvador (Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre os Direitos Humanos) sendo franqueados os Direitos Culturais. Em novembro de 2001, a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural é adotada pela UNESCO. Podemos lembrar ainda Genebra em 2003 e a Plataforma de Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais de 2004, na cidade de Recife.

É recente, portanto, constar da agenda dos países desenvolvidos a proteção ao Meio Ambiente e a inserção dos Direitos Culturais como Direitos Humanos Universais.

Os Direitos Culturais relacionam-se à especificidades culturais de cada indivíduo ou comunidade, sendo-lhe (s) garantido o direito de manifestação plural dos seus interesses.

A abrangência deste tema relaciona-se diretamente com o que acabamos de presenciar no nosso cenário político. Até poucos dias, não se daria crédito a quem disse que Meio Ambiente seria um aspecto decisivo para a existência de um segundo turno nas eleições brasileiras. Mesmo porque, pesquisas (IBGE) indicam que Cultura, Meio Ambiente e Taxa de Juros estão entre os assuntos que menos interessam aos brasileiros.

No entanto, em linha com o que venho dizendo aqui reiteradas vezes, Sustentabilidade Ambiental e Cultura são questões extremamente presentes na Sociedade Brasileira de um modo ou de outro.

Mesmo que muita gente insista em não considerá-las como necessidades primárias comparando Cultura e Sustentabilidade Ambiental às profundas desigualdades, ao perverso cenário de desenvolvimento com juros extratosféricos, à ainda má distribuição de renda, aos déficits em saúde, educação, habitação etc. na ponta, para o cidadão não é bem assim. 

Considerando que os discursos comuns dos candidatos já assegura uma razoável continuidade de melhorias, na medida em que o individuo se propõe a decidir caminhos, a fazer escolhas sobre o melhor cenário para sua sobrevivência e de seus filhos, Meio Ambiente e Cultura, quando apresentados com qualidade, são fortes fatores de motivação.

Exemplos disto são a forte presença de pessoas de todas as classes sociais nos concertos sinfônicos, a opção por espetáculos de boa qualidade e o consumo de bens culturais diversos quando lhes é dada a possibilidade de acesso.


A nítida força da candidata Marina Silva apareceu no que se chamou a onda verde, unindo o discurso da Sustentabilidade Ambiental e do Planejamento com visão de futuro. Duas questões intimamente ligadas.

Isto foi o suficiente para ajudar a mudar a realidade das eleições, ou pelo menos foi o diferencial sensível para a nova etapa.

Em minha opinião, é obrigatório que a Cultura componha a pauta para o segundo turno. Esta precisa se tornar uma questão de base, somando-se ao conjunto de idéias dos candidatos como o que de fato poderá indicar diferenças de posicionamento ( e de resultados) nos próximos dias.

Com avanços pontuais, a Cultura no Brasil tornou-se um buraco negro e exigirá soluções rápidas e objetivas do próximo Governo Federal. A produção cultural responde hoje por algo em torno de 6% do PIB. Visto desta maneira, estamos falando de um volume enorme de recursos. Este número torna-se conservador se lembramos que a atividade cultural no Brasil é esquálida, dependendo de um sistema de financiamento sem nenhum aperfeiçoamento sensível nos últimos 8 anos, com problemas nas diversas áreas, sem políticas e, em decorrência, sem programas que contemplem a generalidade do fazer cultura. Para não ser injusto, onde há resultado é muito pouco e, na área das artes eruditas, em particular da música e da ópera, não houve avanços - nada de relevo que de fato se possa considerar como atividade estruturante e pensada para o futuro.

Repito. Aí está um bom mote para o segundo turno. Respostas nesta matéria podem auxiliar efetivamente a qualificar os programas de interesse público.