sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (45)



A falta de mão de obra qualificada é um fator de inibição para o crescimento do país que se obriga a fabricar técnicos em série para suprir as mais diversas necessidades. 

Na Cultura não é diferente e faltam generalistas - gestores que tenham a visão global dos processos culturais e que conheçam as linguagens e distinções técnicas.

Não é que que os profissionais da área devam conhecer tudo. Não se trata disto, mas quando um espetáculo entra num teatro o que se espera é que os gestores daquele equipamento conheçam a linguagem relativa àquela atividade. O que se depara muitas vezes na prática é que pessoas com habilidades ou conhecimentos relacionados à determinada atividade seja empossados em determinados cargos sem a qualificação técnica (e conhecimento artístico) necessário para cumprir adequadamente seu papel.

Geralmente, um bom técnico em determinada área - e isto é apenas um exemplo - não reúne as características necessárias para administrar um teatro por mais qualificado que seja para gerenciar a sua própria atividade. Perde-se um tempo enorme para se obter os resultados e a visão do conjunto necessária para uma boa gestão.

Sofre-se também com a promoção de pessoas em determinados patamares para outros para os quais não estão absolutamente preparados. É o caso de um produtor que é promovido a diretor de um determinado espaço cultural sem a devida experiência ou qualificação, um aderecista que se torna figurinista porque leva jeito... Há poucos dias, ouvi uma explanação de um excelente designer de luz para um novo assistente. Dizia ele: "você é muito jovem e está começando na área. Primeiro, você precisa carregar estes equipamentos. Se você gostar e desejar, daqui a pouco irá subir nas escadas e pendurar refletores nas varas de luz, depois aprenderá a afinar, mais tarde a anotar e fazer os mapas de luz, depois operar e, quem sabe um dia, se você estudar e se dedicar muito, você aprenderá a desenhar a luz e assinar o trabalho, entendendo os fundamentos do teatro, as teorias de cor, as necessidades. Mas se você for um bom técnico já será suficiente e um caminho importante para a vida toda". Sábio e óbvio, não é? Mas o gestor precisa conhecer este caminho e especificidade para não errar na avaliação dos profissionais com quem trabalho. Um bom técnico não é um bom iluminador, da mesma maneira que um bom iluminador não é um bom diretor de palco.

Um diletante de música, por mais conhecedor que seja da história do gênero a que dedicou boa parcela de sua vida, não possui os conhecimentos necessários para transformá-lo em profissional da área. Comprar quadros, ir a museus, freqüentar shows de rock, gostar de ler poesias, colecionar dvds de ópera, estudar piano em casa, ir a teatro, ser assinante das mostras de cinema, não transforma as pessoas em pintores, marchands, poetas, diretores de teatro, pianistas de concerto, cineastas ou mesmo em críticos de qualquer destas atividades artísticas e, menos ainda, em gestores de pinacotecas, teatros, centros culturais, entidades de formação e difusão. Geralmente estas pessoas são excelentes conhecedores da atividade que exercitam para seu próprio prazer, mas isto não os credencia para mais nada além disto. Poderiam, sim, a partir deste conhecimento preliminar, investir tempo e recursos no aprendizado de atividades correlacionadas, mas geralmente abdicam desta prática pelo simples fato de que acham (ou são estimulados a achar) que o conhecimento acumulado nas suas vidas é suficiente para realizar o restante. 

Não existem ainda cursos em nível universitário dedicados à formação de gestores com esta visão de interesse prático. 

Enquanto escrevo este post lembrei de uma situação "engraçada" em que gestores de várias áreas reunidos não conseguiam conceituar adequadamente um assunto específico da área da cultura sem perderem um tempo enorme negociando o que é Linha do Horizonte* que nada tem a ver com skyline e nem com o horizonte que vemos numa determinada paisagem. 

Neste tema não dá para manter o bom humor.




(*) - A Perspectiva Real – também conhecida como Fotográfica – é uma regra utilizada para se representar os objetos, construções, figuras e a natureza da maneira como são vistos pelo olho humano, em suas formas tridimensionais. 
Foi criada pelos arquitetos da Idade Média, que buscavam uma fórmula de representar os seus projetos de maneira mais realista possível.A regra consiste em situar uma linha imaginária (Linha do Horizonte) à altura dos olhos do observador, definindo, assim a sua posição em relação ao objeto ou cena observada; tudo que está abaixo da linha do horizonte é visto de cima para baixo; aquilo que está acima da linha é visto de baixo para cima e quando o objeto está localizado sobre a linha do horizonte, ou seja, no mesmo nível dos olhos do observador, não é possível enxergar nem a parte de cima nem a parte de baixo.