quinta-feira, 29 de abril de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (18)

Bailarina do Australian Ballet
by Bob Pearce

Sempre acreditei que o mercado resolveria tudo como um ser autônomo, capaz de tomar decisões e de se engajar nas causas justas e adequadas.

Penitencio-me. Trata-se de uma inversão de ótica. Veja se tenho razão.

Sabemos que a noção de mercado é de ação a favor de si mesmo (o mercado se regula, se controla etc.).

O mercado é uma parte do conjunto de forças que atuam na sociedade e não a totalidade dos mecanismos disponíveis para resolver o principal dilema da Cultura (financiamento com sustentatilidade).

Sendo parte, como imaginar que seja viável ter o mercado agindo como o todo? Agindo a seu favor, como esperar que sua ação seja pró coletivo?

Ficou clara a inversão? O mercado jamais irá agir a favor da coletividade a menos que seja integrante a própria coletividade (o que é impossível por moto próprio graças a sua própria natureza "individualista e centrada nos seus próprios interesses etc).

Talvez esteja aqui a estratégia construtiva se encontrarmos uma maneira de incluir o mercado com partícipe de nossos interesses artísticos, inclusivos etc.

Isto significa que somente nós, interessados, discutindo, dialogando, arejando o discurso, seremos capazes de mudar esta realidade.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (17)

Angelus
de Roberto Ferri

Onde não há distribuição de riqueza, reina a barbárie.

Nós da Cultura Erudita parecemos ratazanas esfomeadas brigando pelo último pedaço de pão, pelas sobras de uma sociedade que desaprendeu a preservar o que deveria lhe ser caro e precioso.

A imagem é muito forte? Você que me lê não se sente um rato comendo migalhas? Ótimo. Menos mal. Um a menos.

Mas qualquer que seja o seu status, observe ao seu lado. Note o quanto os seus colegas reclamam, quanto dizem que preferem calar a falar, sabe como é, não é? Preste atenção, em quantos pensam em deixar o país em busca de oportunidade de trabalho, ou ainda quantos dizem estar em dificuldade.

Ou somos um monte de reclamões ou tem alguma coisa errada. As pessoas põem a boca no trombone por três razões: por que são músicos e o seu instrumento é este, ou, usando o trombone como força de expressão, têm uma perturbação que os leva a fazer estardalhaço por qualquer coisa, e, finalmente, como terceira hipótese, porque a situação está mesmo no limite. 

Neste caso, estamos em tempo de reparação. É momento de reflexão e correção de rumo.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Carlos Gomes no mapa do Brasil (14)

Batutas no Museu Histório Nacional
Da esquerda para a direita - Carlos Gomes (1 e 2) e Francisco Braga (3)

De manhã bem cedinho pode-se pegar um carro em Chapecó e, não fossem as curvas, se chegaria a Concórdia numa reta só pela BR 283.
Saindo de Concórdia é melhor passar por Joaçaba, a “Princesinha do Oeste”, para chegar a Lages. A quem perguntar se é possível dar um pulinho em Curitibanos antes da ida a Lages, é bom lembrar que é preciso uma volta um pouco maior, mas é perfeitamente adequado também.
Chegando em Lages será necessário dar uma boa olhada no mapa para chegar a Criciúma no sul do Estado e, finalmente, Tubarão, uma cidade próxima ao mar, à serra e de águas termais.
O que estas 7 cidades têm em comum?
Além do fato de serem todas do Estado de Santa Catarina, também têm em comum o Rua Carlos Gomes presente no mapa de cada uma delas.
Bom passeio.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (16)

Ópera de Sidney
foto de Max Dupain

Tenho insistido na questão de construção de teatros e as necessidades de profissionais com visão de ocupação estarem envolvidos no projeto.

A razão é muito simples. Quando se trata de um teatro privado, é um problema do investidor o que faz com seu dinheiro. Mas, quando o teatro é público, o problema é de todos e cabe ao poder público preservar a melhor maneira de utilizar os recursos oriundos dos impostos. Cabe aos profissionais a vigilância para que tudo seja feito como necessário.

É preciso que ao se construir um teatro se tenha clara a necessidade de fazer a obra e ocupá-la adequadamente. A obra de um teatro se completa quando o teatro está "vestido" por dentro com todas as necessidades resolvidas: a roupa da caixa cênica (varas de luz funcionando, de cenografia, equipamentos de luz, de som, camarins em ordem etc.).

Isto parece muito óbvio? É óbvio. Mas não é o que acontece na prática na maioria das vezes.

O Prefeito manda fazer a obra e a patuléia aplaude. Passada a fase de projeto, obra, vem a inauguração. Como o teatro não está pronto e geralmente já é fim de governo, a desculpa é inaugurar como der e ocupar depois. A turma da Cultura corre, aluga tudo luz, som e demais coisas. O Prefeito e as autoridades fazem discurso, entregam o importante teatro, valorizam a Cultura, posam para a foto e pronto.

O elefante branco segue em frente, sem iluminação artística, sem som, com goteiras, com problemas na porta do camarim que não fecha, a descarga que não funciona, o vazamento da pia, continua assim por anos, sem registro formal do Diretor do Teatro que é emprestado de outra Secretaria, com o técnico (o faz-tudo do teatro) se dividindo entre vários equipamentos.

Quem já viu isto?

A pergunta é como faremos para mudar esta realidade? Como modificar esta cultura oportunista? Como construir mais equipamentos culturais, mas de forma adequada? Como usar os erros cometidos aqui e no exterior a nosso favor?

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (15)

Detalhe do painel externo Teatro Nacional de Brasilia
foto Augusto Areal

Todo teatro projetado por Niemeyer é sinônimo de encrenca. Não se trata de demonizar o nosso ícone, mas de nos rendermos a um fato.

A impressão que se tem é que Niemeyer sempre quis punir os artistas criando as mais controversas formas de ocupação dos espaços de back stage. Este descaso com o projeto em si - com a ocupação do espaço e as necessidades - é parte do notório saber do centenário e admirável criador.

Mas não pensem que este texto é um manifesto pró-licitação de novos arquitetos, ódios mortais ou coisa que o valha. Não se trata disto.

O que estou pondo em discussão é a necessidade óbvia de envolvimento de profissionais que irão ocupar um determinado teatro ou que pelo menos sabem prever quais as necessidades de um espetáculo de dança, de ópera, de teatro, de música popular, música de câmara ou coisa que o valha. São espetáculos diferentes com necessidades diferentes. Este envolvimento precisa ser permanente, do projeto à conclusão da obra.

Lembro-me que certa feita, fui ao Teatro Pedro Ivo em Santa Catarina. O projeto previa um fosso de orquestra com o piso do palco sustentado por uma viga. Não é que na obra, a engenharia colocou uma coluna bem no meio do fosso? Os maestros que se adaptassem a dirigir orquestras com uma coluna de 40 centimetros na sua frente, entre ele e a orquestra.

Isto significa que o arquiteto nem sempre é culpado. Agora, aqui entre nós: a culpa é do engenheiro? De quem detalhou o projeto? Ou é do processo como as coisas são institucionalizadas?

Não seria o caso de se conversar a respeito com os profissionais que atuam na área, ou que pensam os problemas de ocupação? Afinal, qual arquiteto no Brasil, engenheiro, mestre de obras, comprador, secretário de cultura, governador, irá lembrar - ou, maioria dos casos, saber - que é necessário ter um sistema de som interligando palco e camarins para avisos gerais? Ou que é necessário revestimento lavável nas paredes dos camarins, pois maquiagem no corpo suja? Ou que carga precisa ser descarregada perto do elevador montacargas ou do mais fácil acesso ao palco?
Volto ao tema.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (14)

Construção da Ópera de Sidney - Austrália
foto by Max Dupain

Não me lembro de um técnico ou artista que tenha elogiado o resultado final de um teatro projetado por Oscar Niemeyer. Aliás, de um modo geral, não há quem não reclame da maneira como os teatros são construídos no Brasil.

É voz corrente que se privilegia a construção de um novo equipamento sem que haja uma preocupação com equipá-lo adequadamente. De fato, a maioria dos teatros realizados pelo poder público são "concluídos" sem que lhes seja dada a condição adequada para ocupação e as desculpas são as mais variadas. Basta saber, por exemplo, que o teatro é construido sem o desenvolvimento de um plano de negócios, ou um plano de ocupação.

Como se dá o processo de construção?

O governante quer um teatro seja por que razão for. O primeiro passo é contratar um projeto - preferencialmente sem licitação por notória especialização e garantir os recursos gerais para a obra.

Aí estão os primeiros entraves. Não interessa discutir proposta de ocupação, necessidades artísticas, porque na cabeça da maioria dos gestores está se fazendo uma obra e não um espetáculo. "Obra é obra": projeto, cimento, visibilidade e inauguração com um show. Não interessa do quê, nem como.

Voltarei ao tema.


quarta-feira, 21 de abril de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (13)

L'Opéra Paris Garnier
Frank Meyers Boggs
Democracia não é fácil.

O processo democrático é mais demorado. Evitando a saída fácil da metáfora, mas optando pela analogia adequada, a democracia, como toda edificação, constrói-se pela base. Isto significa que este dificil exercício do diálogo deve nortear as relações na atividade Cultural.

A possibilidade de se construir políticas Culturais adequadas sem a consulta prévia aos artistas que de fato exercem as atividades específicas é praticamente nula, pois o projeto deve nascer destas relações construídas por intermédio de indivíduos e também de entidades com caráter associativo.

Se entendemos que políticas e seus programas são necessários a partir do poder público, também devemos imaginar que estas atividades têm como fundamento a busca de sustentatibilidade para não cairmos também na triste constatação de que ao se construir um Estado que tudo deve nada mais estamos que fortalecendo aquele que tudo pode.

Também não devemos cair no erro de que sustentabilidade seja ausência de participação do Estado no financiamento da Cultura. Há programas que não fecham a conta e não fecharão jamais, sendo no entanto, imprescindíveis. 

Sustentabilidade está muito mais associada à garantia de direitos do Cidadão e à garantia do exercício saudável da produção Cultural.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Carlos Gomes no mapa do Brasil (13)


Amanhã, dia 21 de Abril, Brasília completa 50 anos.
Em depoimento, Juscelino Kubitscheck relatou que a pergunta de um advogado num comício em Jataí o levou a refletir sobre a necessidade constitucional de construir uma nova cidade para abrigar a capital federal e a prometer imediatamente que faria a obra.


Assim, diz a história, nasceu a idéia de fazer Brasília que ganharia o projeto urbanistico de Lúcio Costa sobre um "x" marcado no solo do plano central. Uma cidade em cruz que ganharia as curvas inusitadas de Oscar Niemeyer e mobilizaria milhares de homens e mulheres na sua construção.


Brasília nasceu sob o signo de um olhar central sobre o país onde até hoje as desigualdades ainda são tantas. Se conseguimos reduzir a perspectiva surda da pobreza intolerável e avançamos para o crescimento economico nestes anos de democracia é um grande avanço.
Fica sempre a questão de como transmitir ao jovem a história e permitir-lhe a visão crítica para que possa reconhecer as limitações, qualidades e viabilidades do seu país.


A política é um fiel condutor dos equilibrios. Em Brasília, no Distrito Federal, ou numa pequena cidade do Rio Grande do Norte, um belíssimo Estado. A cidade de Natal tem vários municipios próximos. Entre eles São Gonçalo do Amarante, uma cidade de grande fé religiosa a ponto de ter 42 santos padroeiros.


A assessoria* do Prefeito Municipal manda para o blog a informação de que na esquina da Rua Carlos Gomes com Rua Aurora instalou-se no último final de semana um evento multidisciplinar que envolveu todos os organismos municipais, realizando várias atividades e inclusive oficinas culturais - uma delas que serve de mote para a foto desta semana.


Se por um lado neste evento o prefeito Jaime Calado conseguiu que algumas pessoas pudessem dar adeus à casa de taipa e passem a morar em casas de alvenaria, temos aí, sem dúvida, um grande avanço social, e, de outro, se adultos e crianças, identificam na Rua Carlos Gomes um ponto de aprendizado e entretenimento, ganhamos pessoas mais conscientes de seu papel de cidadãos.

Fica aí o recado e proposta para o Gleydson de Almeida, diretor do Teatro Municipal, não esquecer do compositor, da sua obra, da música erudita, numa cidade tão musical e tão lindamente romanceira com Dona Militana (http://www.saogoncalo.rn.gov.br/cultura_donamilitana.php). Quem sabe dia destes não nasce uma nova ópera brasileira baseada nestes cantos de memória, da nossa memória armorial, desta mistura fantástica de princesas, guerreiros, batalhas que compõem a rica musicalidade nordestina?

*agradecimentos ao Daniel Cabral - Secretário de Comunicação e a seu assessor Ledson França.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (12)

Antes do Ballet
Pierre Carrier-Belleuse


Uma das coisas mais complicadas é a garantia das liberdades individuais e na Cultura esta é uma das questões mais complexas.

Tenho refletido bastante sobre o papel do artista e do indivíduo quando se vê ferido nos seus direitos individuais.

Os problemas são enormes e diversificados com sofisticações específicas em cada área. Artistas são afetados por coisas elementares como pagamentos de cachê, o cancelamento de contratos sem a justa contrapartida, problemas com agentes e bizarrices das mais diversas que vão da falta de seguro por acidentes a audições de cantor por skype como corre à boca chiusa aqui e ali.

Está posta a questão. Como institucionalizar a atividade artística de modo a que as relações se dêm de forma clara, transparente, séria, profissional, sem que o artista precise silenciar sob pena de não mais ser contratado, de ser tratado como inimigo? Como fazer para que o profissional de qualquer área da Cultura seja respeitado e tenha voz, sem a necessidade de se submeter, de ser bonzinho, silencioso, cordial?

Numa sociedade "moderna", para este Brasil que virá, precisaremos enfrentar esta questão e afastarmos definitivamente a falta de ética, de profissionalismo, de respeito. Não parece chegada a hora de se buscar uma resposta para isto? De termos Instituições sólidas e adequadamente fundamentadas?

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (11)

Ensaio de Ballet
por Degas
A kombi tinha pelo menos uns 8 anos de estrada com alguns remendos, a lataria com algumas manchas. No vidro traseiro uma plaquinha gaiata: É velha mas tá paga.


Aproveitando o humor, a história bem se aplica ao conceito de produção de ópera. Sempre se fala que a ópera é um espetáculo caro, mas se levarmos em conta que uma determinada produção será montada e apresentada nos 10 anos seguintes, o custo inicial fica muito diluido e representa, em termos relativos, um custo muito baixo.


O mesmo se aplica a outras atividades e por isto o gestor de Cultura deve ter uma visão abrangente do processo.


Infelizmente, isto ainda não acontece no Brasil com a frequência desejada. Com isto perdemos em velocidade já que o díálogo se torna mais dificil e muitas vezes sujeito a equívocos.


O dilema, portanto, está na necessidade de aperfeiçoamento de gestores para área com a criação de cursos específicos que auxiliem na identificação de peculiaridades administrativas, técnicas e artísticas da Cultura, principalmente considerando que em todo o país temos apenas dois ou três cursos de perfil acadêmico.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Carlos Gomes no mapa do Brasil (12)


Capa da edição em português da ópera O Guarani

A origem dos nomes é sempre uma coisa curiosa.

É muito natural imaginar-se que certo Sr. Vicente Sabará Cavalcante proprietário do seringal Ouro Preto lhe tenha dado o nome da cidade Mineira de Ouro Preto até por levar no seu próprio a referência a outra cidade também de Minas Gerais. Natural, claro, mas a história ganha outra possibilidade se olharmos a região de Ji-Paraná, no Estado de Rondônia, onde fica a Serra do Ouro Preto, assim denominada por causa de umas pedras pretas características da região.

Factível portanto, que a Cidade de Ouro Preto do Oeste tenha assim sido denominada mais por causa das pedras, da Serra e menos por causa do Sabará ou mesmo da Ouro Preto Mineira.

Além desta pequena referência deste Brasil tão distante da sala onde escrevo este blog, o bom disto tudo é saber que quase no perímetro do traçado impecável das ruas de Ouro Preto do Oeste, está a Rua Carlos Gomes, mais um lugar de memória da ópera.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (10)

Ópera Rigoletto - Festival de Ópera do Theatro da Paz
Leonardo Neiva e Sergei Dreit


Sempre se fala em financiamento, incentivo, liberação de recursos, patrocínios, mecenato, doações à Cultura.

Mas vamos pensar um pouco: do que é que se está falando?

Vamos inverter o olhar e entender claramente que a produção da arte, seja ela qual for, é uma atividade de interesse coletivo, de interesse público porque auxilia os cidadãos na reflexão sobre a sua identidade, lhes acrescenta uma visão dos seus pares, dos seus vizinhos distantes. Dá ao indivíduo uma consciência crítica que lhe permite perceber seus horizontes pessoais, sociais e políticos. Trata das relações sociais sob uma ótica crítica, seja na familia, no trabalho, na religião etc. Permite uma constatação do Belo. A arte não é necessáriamente contra ou a favor, mas pode e deve posicionar pessoas de forma a serem contra ou a favor.

A arte tem uma função educadora quanto justapõe ética e estética.

Ao mesmo tempo em que modifica de forma inteligente o meio ambiente a seu favor, através da arte o homem recebe os indicadores de seus erros e acertos.

Isto tudo tem um preço.

Por isto Governos devem promover e garantir a produção cultural e se não o fazem estão agindo contra os interesses da sociedade que representam. A questão não é partidária, muito embora seja dada à orientação política a prerrogativa de eleger atividades que se correlacionem com seus principios, sem entretanto criar hiatos de continuidade no interesse coletivo.

Por isto as empresas têm obrigações e responsabilidades com a produção cultural uma vez que utilizam da força de trabalho e se viabilizam pela via de consumo de seus produtos e serviços. Se necessitam de comunidades sólidas, devem contribuir para que seu desenvolvimento se dê de forma saudável. Não basta às empresas a lógica de mercado, uma vez que o mercado não se sobrepõe ao pensamento e à liberdade de formulação do pensamento criativo.

Da mesma forma, a propria sociedade, o cidadão, tem a obrigação de dar sustentabilidade aos seus artistas também investindo seus recursos na proporção de suas possibilidades e demandas particulares.

À produção cultural, por sua vez, cabe a imensa responsabilidade de transformar, indagar, aguçar, investigar, inferir, superar, demonstrar, persistir, resistir, de possibilitar que homem veja no Belo a sua essencialidade, a sua aproximação e semelhança à Divindade.

Nota de Rodapé (2)

Hoje saiu na Sonia Racy (O Estado de São Paulo) a seguinte nota:

GOGÓ
O Metropolitan Opera de NY convidou e Paulo Szot disse OK. Participará da opereta O Morcego. Também no Met, o barítono brasileiro foi confirmado para Carmen, na temporada do ano que vem.

Esta informação complementa o post Dilemas da Cultura (9), de 5/3/2010.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Carlos Gomes no mapa do Brasil (11)


Frente e verso da antiga nota de 100 cruzeiros
com D. Pedro II* (f) e a Cultura Nacional (v)


Quem nunca viu um pium não deve reclamar dos olhos ou dos óculos.

Pium não se vê, mas se sente na coceirinha infernal que aqueles bichinhos deixam depois que picam a pele do descente. Não é a toa que os tupis dizem do pium "aquele que come a pele". São os irmãozinhos, primos ou qualquer grau de parentesco próximo dos borrachudos e, portanto, devem ser da familia dos simulideos. O Aurélio garante que são dípteros, sobre o quê só posso concordar sem pestanejar porque nunca vi um de perto para ter certeza disto. Mas, se está no Aurélio, a gente acredita e espalha. Além de dipteros, parentes canhotos das muriçocas, pode-se dizer que são antliados, halterados, hauterípteros e haustelados. Muita coisa para um bichinho tão pequeno.

De todo modo,  a cidade de Paraiso do Tocantins surge emancipada em 1963 a partir do desmembramento do municipio de Pium que leva o nome pelo excesso dos bichinhos no passado ou por outra razão que não consegui saber. Fica o desafio para os historiadores do Tocantins.

Em Paraiso do Tocantins, cidade muito antes da capital do Estado - Palmas - há uma Rua Carlos Gomes cruzando a Vinicius de Morais. Um modelo de convivência e memória que mais uma vez demonstra a convergência entre aqueles que trabalharam a qualidade da música e da poesia, cada um a sua maneira. Transversalmente.

(*) D. Pedro II,  Imperador do Brasil ao tempo de Carlos Gomes.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Dilemas contemporâneos da Cultura (9)

A primeira saída
Pierre Auguste Renoir
A maior estrela brasileira da cultura no exterior é o barítono Paulo Szot.
Repetindo: a maior estrela brasileira da história recente é um cantor de ópera.

Amanhã não cairão centenas de e-mails na minha caixa postal discutindo o mérito inquestionável das duas afirmativas acima.

Paulo Szot não está cantando melhor agora. Antes de se tornar uma estrela internacional, ganhador do Tony Awards, sucesso de crítica "lá fora", ele já era um excelente cantor, profissional e colega, sofrendo aqui as mesmas dificuldades de espaço de trabalho que outras dezenas de igual valor e qualidade. A OSESP, que reconhecemos merecidamente como nossa melhor orquestra, nunca recebeu Paulo Szot. (*)

Sua estréia na mítica Metropolitan Opera House não se deu com um papel daqueles que estávamos habituados a ve-lo/ouví-lo nos teatros brasileiros como seria óbvio. Não. Pelo contrário, os programadores do MET tiveram a ousadia e apostaram na qualidade ao contratá-lo para O Nariz - um papel complexo, para um bom ator e cantor.
Sem qualquer possibilidade de diminuir um milionésimo sequer suas qualidades, conversava com outra colega - fã de carteirinha - e nos questionamos sobre quantos outros Paulos temos no Brasil.
Se nem todos são iluminados como ele a quem devemos aplaudir sempre, o que fazer para dar a dimensão correta aos nossos cantores? Como devemos sacolejar os programadores dos teatros a dar espaços aos artistas de estatura nas poucas oportunidades que temos nesta fase de transição? (**)
Na minha maneira de entender o problema, devemos privilegiar a qualidade e sermos radicais nisto. Para isto, precisamos dar espaço de trabalho aos nossos profissionais da ópera e criar o máximo de oportunidades para que se mantenham ativos.
Ao mesmo tempo, é necessário desenvolver as "vozes jovens", criando condições para que cantem aquilo que suas condições fisicas e técnicas permitam. Trocando em miúdos, sopranos não são todas iguais e "vozes jovens" cantando papéis adequados para "vozes maduras" é um desastre. Qualquer um que tenha um mínimo de responsabilidade com o canto sabe que a inadequação de papéis estraga a voz. Como se diz na analogia, obrigar o cantor jovem a cantar papéis que só poderia cantar dez, quinze anos mais tarde, é fazê-lo gastar o "capital" e não os "juros".
Feito este parenteses, fica mais uma indagação.
Precisamos estar atentos à qualidade de nossos profissionais. Já avançamos bastante no Brasil em várias áreas da cultura, mas ainda é muito pouco.
Não serão governos que resolverão estes problemas, pois são apenas parte da solução. Nós, profissionais, devemos, com urgência, criar mecanismos de proteção de nossos valores e nos posicionarmos criativamente, com as parcerias certas para avançarmos de forma segura nas nossas carreiras.
Não há como desenvolver sem participação, responsabilidade, visão de futuro, sustentabilidade e ética.
(*) fica uma sugestão para o Arthur Nestrovsky montar uma série para os solistas brasileiros, com direito a gravação, dvd, programa de tv etc. etc.
(**) tenho a convicção de que estamos vivendo o final de uma fase de transição.