quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (33)

Máscara - 2005
Antonio Carmo*

Retornemos à ausência de ídolos no Canto Erudito no Brasil.

No post passado atribuí a responsabilidade ao próprio cantor em primeiro lugar. É duro pensar nisto, sei que é dificil admitir. É muito mais fácil ver o problema no outro.

Sabemos que os problemas existem pela ausência de um mercado organizado com contratantes com volume de trabalho, não há uma rede de produtores interessada no segmento - aliás uma grande bobagem e isto já poderia ter avançado mais - os agentes não funcionam como prestadores de serviço para o artista, mas apenas intermediários, não há uma articulação nacional para se cuidar da imagem do profissional da área, os agentes públicos têm uma visão estreita da questão até por uma questão partidária histórica (isto é outro tema...). Tudo isto é parte da demanda.

O artista é o ponto de partida para tudo isto. Ao menos deveria ser. Recentemente criou-se uma Associação Nacional dos Profissionais de Ópera que ainda, convenhamos, não avançou o suficiente e está neste momento buscando mecanismos sustentáveis de financiamento e discutindo questões importantíssimas com várias esferas. Não avançou o suficiente, mas é um canal de representação e expressão forte o bastante para falar pelo setor.

A Associação é uma ação de conceito coletivo. Ao artista cabe pensar seu projeto.

Isto mesmo. Ao artista falta um projeto. Obviamente não estou falando de projetos de espetáculos, mas uma proposição de vida, a resposta à pergunta "o que farei daqui há 10 anos?"

Há poucos dias, conversava com um jornalista que me dizia ter entrevistado um cantor (ou cantora, não importa) e me disse que teve ótima impressão na conversa, que era uma pessoa muito bem informada, culta, com qualidades artisticas que já conhecia e pessoais que sequer imaginava. Desta conversa, o (a) artista ficou de enviar para ele algumas gravações, alguns programas, um DVD (destes "piratas" que os cantores utilizam). Pergunta do jornalista para mim: "você viu quando chegou o material?... Eu não até hoje e nem um e-mail, um recadinho no facebook ou coisa parecida".

E você? Viu o material? Este é um caso recente. Quantos destes já vimos?

Vejam que o (a) profissional a que ele se referia é gente da melhor qualidade.

Por que nada foi enviado e a promessa não cumprida? O material não era tão bom assim? Faltou suporte técnico para ter boas gravações?

Qual a real distância entre intenção e gesto?


(*) Antonio Carmo nasceu em Lisboa, em 1949. Sua opção na pintura é pelo amor e pela música. Se há tristeza, ela aparece de forma quase bucólica. Há certo otimismo no seu trabalho representando as Estações do ano com uma intensa palheta de cores vibrantes.