quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Dilemas Contemporâneos da Cultura (58)

O jovem baco - 1884 (*)
William-Adolphe Bouguereau

É sempre uma boa surpresa quando somos brindados com uma coisa nova.

Aliás, brinde é a palavra mais adequada ao tema que trato hoje neste blog.

Vem de Manaus, um brilhante trabalho que recebi - felizmente incluído entre os poucos felizardos - de um dos mais brilhantes pensadores da música popular no Brasil: Edson Gil Costa. 

Provavelmente, você, leitor, não ouviu falar dele e, Costa irá me ligar dizendo que exagerei (olha, Edson, não precisa ligar, tá?). Mas é assim que o reconheço: brilhante. 

Costa integra o CDF, uma sigla bastante apropriada para designar o Clube dos Discófilos Fanáticos, um grupo de amigos que se reúne com freqüência para conversar sobre a Música Popular Brasileira.

Recebi um exemplar de um livrinho que ficou aqui amadurecendo desde início de 2010. Trata-se de um delicioso exercício de associação entre a música e o vinho.

Como diz no título complementar são "considerações muito pessoais sobre harmonização enomusical".

O neologismo fundamenta "algo para o qual simplesmente não existe fonte de pesquisa. [...] A harmonização entre eles (prazeres enológicos e musicais) pode ocorrer por antagonismo, mas nunca, nunca mesmo, pela indiferença". 

Após este discurso sobre o método, o livro nos informa que são cerca de 24.000 nomes para mais de 3.000 variedades de uvas viníferas. Destas, 150 são plantadas comercialmente.

Considerando que além de vinhos, no planeta existem inúmeros compositores e que os adjetivos "elegante, exuberante, chato, complexo, simples, austero, fechado, fresco e radiante" servem tanto para vinhos como para compositores, o autor selecionou 23 uvas brancas e 23 tintas que considera as mais interessantes e conhecidas, experimentou todas e harmonizou com 55 compositores (um se repete, pois se harmoniza com duas uvas) que tiveram 56 canções interpretadas por 56 intérpretes. 

Desta complexa avaliação, nasceu um livro delicioso que me permito apresentar a vocês em uma única taça.

Para que ninguém me chame de parcial, escolhi a primeira harmonização das uvas tintas que aqui reproduzo.

A uva escolhida a Cabernet Sauvignon cuja característica é ter bagos escuros e pequenos, casca espessa e pouca polpa. Aromas de cassis e pimenta, cerejas negras e grafite. Produz vinhos austeros, tânicos e muito coloridos quando jovem, mas, quando amadurecidos, tornam-se macios, equilibrados, longevos e fabulosamente complexos. Tem maturação tardia. Cor vermelho-escura com nota violácea em sua primeira juventude, que se torna vermelho tijolo com o tempo. Junto com a Cabernet Franc (sua prima) e Merlot formam o princípio do corte bordalês.

Apresentada a uva, principais referências, vinhos e origens, Costa apresenta o comentário enomusical: Cabernet Sauvignon considerada a rainha das tintas, é uma uva pequena e que se adapta muito bem em inúmeras outras regiões do mundo, produzindo belos e interessantes vinhos sem perder suas características principais. Esta uva, quando produzida dentro de suas melhores condições e sem misturas, apresenta vinhos intensos e de aromas bem pronunciados. Exatamente como a música de Tom Jobim que consegue ter interpretações maravilhosas em qualquer canto do Velho e Novo Mundo.

A música sugerida para esta harmonização é Dindi, de Antonio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim.

Qual do Dilema? Beber e ouvir vinho e compositor favorito, ou refletir sobre como identificar e trazer a público o que de inteligente e universal se produz no anonimato (quase) no Brasil.