sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Merecido Recesso.

da Série Niquel Nausea - 
by Fernando Gonsales - Folha de São Paulo - 31/12/2010 

Para evitar a paródia ao Gonzales, descansarei.
Como diz minha amiga Magda com sagaz ironia e humor, El Professor repousa (enquanto pensa).

Aliás todo sujeito que se diz "pensando", finge que dorme ou corre o risco de ser chato... Nesta linha, é melhor não dizer que pensa e propor um futebolzinho na praia, dizer que adora areia entre os dedos, mentiras sociais do gênero. Mudando a frase da Magda me gozando, El Professor apenas repousa.

Isto. E o caso aqui é outro. Sem futebol, areia, mas entre abraços e beijos, livrinhos, passeios de bicicleta, caminhadas ao ar livre (esteira jamais!), comidinhas leves, muita conversa com amigos. um ou outro papo mais sério sobre futuro, leitura de textos de teatro, sketches e rabiscos no primeiro moleskine do ano.

Volto ao blog em 10 de Janeiro de 2011. 

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Bravos da Cultura (1)

O Coro
Edgar Degas

Inauguro hoje esta nova coluna e pretendo mantê-la sem periodicidade definida ainda. Postar quando  o coração mandar e quando tiver algo de bom a dizer a respeito de coisas da Cultura. Não que isto seja difícil, mas como a Cultura é de certo modo a tradução do Belo, do Bom e do Verdadeiro – uma aproximação do Homem à Divindade, exaltá-la me parece necessário apenas para demonstrar o quanto se erra quando se distorce o conceito. Neste caso, apontar defeitos e problemas é mais conclusivo porque nos permite refletir a respeito de como deveria ou queremos que seja.

Bravos da Cultura, entretanto, é para falar bem e sem a preocupação de conclusão alguma.

O que me motivou a iniciar esta coluna no Blog foi aquilo que é o objetivo final da nossa profissão: o espetáculo e a satisfação do público.

Isto mesmo. Fui motivado pela apresentação, sob a regência do Maestro Mário Zaccaro, da Orquestra Sinfônica, do Coral Lírico e solistas do Theatro Municipal de São Paulo, na Sala São Paulo, em 21 de Dezembro de 2010.

A perspectiva privilegiada de visão da Sala (estava no camarote 12 sobre a orquestra, com o Coral Lírico à minha direita e a plateia lotada à minha esquerda) permitiu observar e refletir sobre o nosso papel como artistas num espetáculo como aquele.

São tantas as dificuldades por que passam os profissionais da área para o exercício da sua atividade que somente uma resposta parece ser possível para que se obtenha resultados como aqueles: são profissionais e que à frente de uma boa liderança, conseguem em associação fazer o que gostam da melhor maneira possível.

Zaccaro à frente da Orquestra, do Coro e Solistas estabeleceu-se como o fator de conjunto que permitiria o concerto com a leveza que se obteve. Que me desculpem os demais colegas, mas considero Mário Zaccaro o melhor Regente de Coro Lírico que temos no Brasil. Não temos, e se alguém discordar o espaço é aberto, ninguém em atividade com a sua experiência no país. Zaccaro é um regente de coral lírico, um regente de ópera, conhecendo profundamente os truques do metier, fruto de longa convivência com o gênero, tendo trabalhado como poucos com vários regentes e diretores cênicos. É natural e esperado inclusive que tenha seu espaço profissional ampliado regendo em outras oportunidades a Orquestra do TMSP tão logo sejam retomados os rumos normais do Theatro Municipal, concluída  sua reforma.

Mas este post não deve ser lido como uma ode ao Maestro ou ao excelente conjunto que dirige. Se carrego nas tintas é a expressão transparente do que depreendo do trabalho que há alguns anos acompanho e muito distante a intenção de ser crítico de qualquer trabalho na área da ópera.

Aqui espero ver refletido o sentimento a que fui submetido durante a apresentação do conjunto: enquanto se apresentavam pude observar cuidadosamente a expressão de cada profissional ali envolvido, a maneira como abordava seu instrumento, seu carinho com o programa natalino proposto, um cello com uma touca vermelha, a linha de canto de cada naipe do coral lírico, a coesão do conjunto.

A plateia reagia frenética, enquanto observava, e, quando solicitada a participar com palmas, num instante, olhando e ouvindo tudo, vejo um colega do coral me lembrando com um sinal dos olhos que eu também deveria percutir com as mãos, naquele dia, como plateia.

Foi este o momento em que, tendo trabalhado algumas vezes com aquele conjunto, tive a exata percepção do que é pertencimento, de fazer parte daquela turma, de alguma maneira, estar unido àquele grupo pelos mesmos propósitos profissionais, com as mesmas expectativas de futuro, de algum modo próximo, integrado. Esta dimensão, em que nem sempre nos deixamos envolver, é, agora melhor clareada, a resposta sensível da matéria que une artistas e os torna cumplices.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (53)

Tango 

Não vamos nos lastimar pelo fato de amarmos o tango* (quem odeia, pule para a frase seguinte) e não sabermos qual é o mais novo grupo dedicado ao gênero.

Temos a lastimar a ausência de programas que promovam a circulação de bens culturais para o exterior, bem como mecanismos que facilitem o acesso a intercâmbio, participação em exposições, bolsas de negócios entre outros.

Em algumas áreas da Cultura já se instala o reconhecimento destas necessidades, mas ainda vivemos uma utopia nesta direção. Nos Estados e Municípios, dando um crédito para iniciativas isoladas como os bureaux de cinema, ou um e outro programa, o resultado tangencia o zero.  

O Brasil é, quando muito, receptor de algumas iniciativas e, estas, desde que venham de bem longe da Latin America. Nossa consciência dos vizinhos é restrita quase que somente aos torneios de futebol, mesmo assim vendo os países próximos como adversários.

Há quem advogue no seio da cultura brasileira – esta me parece ser a linguagem apropriada mais retrógrada – que não se deve ter no Brasil qualquer tipo de financiamento (incentivo, investimento direto) para “conteúdos estrangeiros”. Da mesma maneira, há pouco tempo, instalou-se um programa num determinado município em que “só se apoiaria produção de filmes com conteúdo, locações e artistas locais”. Não cito as fontes porque nenhuma das duas merece sequer citação.

O fato é que escudado por aquela idiotice, o aloprado acha que conteúdo estrangeiro é um crime de lesa-pátria e, com este raciocínio de barril de cerveja, esquece que com uma medida destas, não se pode financiar encenação de nenhum texto teatral de autor estrangeiro, ou ter patrocínio para nenhuma orquestra executar Bach, Beethoven, Philip Glass, Paul Mcartney, ou para exposição de Rodin etc.

O outro, motivado sei lá por que desvio, imagina que cercear a liberdade de criar é parte das funções do gestor de cultura. Na sua pequena célula que insiste em chamar de cérebro, nenhum cineasta de sua cidade, com apoio público, poderia fazer um filme com locações na cidade vizinha, ou atores de outro estado, ou diretor estrangeiro.

Há quem se preocupe com extraterrestres – conheço uma pessoa que treme de pavor ante a hipótese de se encontrar com um. No entanto, devemos nos preocupar com estes terrestres que menciono acima. Desculpado o trocadilho, fique atento: há uma mudança em curso, mas tem muita gente puxando a corda contra. 


*Desde Outubro de 2009 o tango passa a ser Patrimônio Imaterial da Humanidade. A decisão da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), tomada durante uma convenção em Abu Dhabi, garante a proteção deste tipo de música e dança.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (52)


Volto ao tema do isolacionismo.

Não é verdade que o Brasil esteja culturalmente descolado do restante do planeta. Da América Latina, não há dúvida nenhuma, pois como já comentei, não recebemos informações sobre o que acontece nos países vizinhos.

Que nossos fronteiriços não saibam o que acontece no Brasil é compreensível uma vez que há uma severa distância entre as línguas faladas. A América espanhola sabe de si. Por outro lado, nosso gigantismo inclusive econômico garante uma pluralidade de informações imensa através de uma infinidade de veículos impressos e eletrônicos, o que não é em si um fator de recompensa sob o ponto de vista da difusão cultural.

Só sabemos o que se passa na Argentina se pegarmos um avião e descermos em Buenos Aires.

Certamente, um ou outro espertinho irá sugerir que consultemos um site qualquer desses países e saberemos tudo o que acontece.

A questão não é esta. Aqui em São Paulo com grande facilidade podemos comprar os principais jornais do mundo em várias bancas.

O problema é conceitual. Não há intercâmbio de informações e, por consequência, não há conexão profissional, intelectual, cultural.

Você conhece Ernesto Sabato? Não? É uma pena. 

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (51)

Pintura de Wesha Kea (Loyver Yui López) 2007

Em San Miguel do Tucumán - Argentina, em Julho de 1935, nascia La Negra, que se consagraria a “voz dos sem voz”.

É provável que muitos que leem este post não tenham a menor ideia do que estou falando.

Mercedes Sosa*, La Negra, a partir de 1967, quando vai para a Europa, passa ser reconhecida internacionalmente e, sendo um ícone na América Latina, a partir de 1970, ganha popularidade com Gracias a la Vida, canção que gravou em homenagem é compositora (e cantora) chilena Violeta Parra. Gravou com vários cantores: com Juan Baez (EUA), Pablo Milanês (Cuba), diversos brasileiros (Chico Buarque, Caetano, Gal Costa, Daniela Mercury e outros), Andrea Bocelli (Itália) e mais recentemente com a colombiana Shakira.

Chego ao ponto.

Se pegarmos qualquer jornal brasileiro, excluindo uma ou duas matérias sobre política (sempre Chaves, Evo), uma ou duas sobre narcotráfico, uma ou duas sobre a desgraça do dia, não encontraremos nenhuma notícia sobre teatro, exposição, dança, ópera, que estejam acontecendo nos países da América Latina.

Confesso que não me lembro de outro cantor ou grupo que tenha o reconhecimento recorde de Mercedes Sosa no Brasil.

Nós não conhecemos a América Latina, não sabemos e não damos a menor bola para a América Latina.

Essa presunção cultural é fruto provavelmente da falta de investimento na circulação de bens culturais nos vários segmentos e da circulação de pessoas.

Apesar de um razoável crescimento de atividades, fóruns, grupos de debates, voltados para o Mercosul ou ainda, esta informação ainda não chegou a atender à produção cultural.

Nossos artistas têm enormes dificuldades para se apresentar fora do Brasil, não só no que diz respeito à logística, mas toda a decorrência da representação.

É evidente que também não há a mão dupla. Nada vem de lá pra cá, nem mesmo coroando eventuais esforços individuais.

Desta forma nosso pluralismo possível segue assim, no singular.


*A arte de traçar kenê pertence tradicionalmente às mulheres, quem, segundo a cosmologia aprenderam a fazer desenhos copiando-os do corpo de uma mulher Inka, proveniente do eterno mundo de fogo do sol que atravessou o rio que separa os imortais dos mortais. Ela trazia sobre a pele os desenhos da jibóia, a poderosa senhora cósmica dos rios e do arco-íris, o caminho que une a água ao sol. Segundo o pensamento shipibo-konibo, todos os desenhos de tudo o que existe se originam nas manchas da pele da jibóia primordial; e por esta razão, para poder ver e fazer desenhos é necessário consumir as plantas que manifestam o poder da jibóia, especialmente, piripiri e ayahuasca.

**Mercedes Sosa morreu em Buenos Aires em 4 de Outubro de 2.009.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Carlos Gomes no Mapa do Brasil (31)

foto proposta por João Papa *

A imagem de Santa Luzia sempre me assustou: ver aquela jovem carregando nas mãos uma salva dourada com dois olhos causa até hoje arrepios involuntários.

Protetora dos olhos e da visão segundo iconografia óbvia, Santa Luzia agrega devotos em todo o mundo. 

No Brasil é um nome frequente no mapa, seja sob a forma de cidade, bairro ou município. Não pesquisei para saber das ruas que levam seu nome, mas é sem dúvida um volume imenso. A fragilidade dos olhos preocupa crentes e descrentes.

Em Brasília, não há nenhuma rua com o nome de Carlos Gomes. Também não deve ter de Santa Luzia, pelas mesmas razões.

Isto não significa que os dois, o compositor e santa, não estejam unidos pela cartografia.

Estão sim, em Luisiania, cidade que recebe o nome em homenagem à santa, onde uma das ruas é justamente uma homenagem ao compositor.

A rua Carlos Gomes está há 58 km de Brasília, onde as ruas não prestam homenagens. 

* se você preferir, veja a foto alternativa para o mesmo post.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (50)

Banco Revisteiro da Pino*
designed by Grão

Recebi algumas ligações telefônicas sobre o "Dilemas nº49", o do Barretão, como dizem. Há certa unanimidade quanto à falta de elegância e cortesia com que foi tratado o tema pelo ilustre, como o chamo. Assim o qualifico porque sua presença marcante é característica no cinema brasileiro. 


Barretão pesou a mão. Respeitado seu direito à opinião fica a sensação de que era desnecessário este movimento do ilustre, a menos que outros interesses norteiem sua conduta. 


Imaginando que se trata apenas de opinião, o conteúdo é truculento, grosseiro e distante do debate. Se estivéssemos todos numa sala em que se discutisse rumos desta ou daquela política é aceitável que ânimos se exaltem aqui e ali. É até saudável que isto aconteça, sendo parte admissível nos debates acalorados. Mas, não. 


Ali foi um excesso incompreensível e sugere apontar para outro dilema contemporâneo: a truculência.


Certos temperamentos são inaceitáveis e a truculência precisa ser tratada como doença. É compreensível que as pessoas "estourem" em determinadas situações, mas o estilo "prendo e arrebento" de triste memória é uma aberração de convívio.


Todos nós da Cultura lembramos de casos em que alguém passou do limite (eu mesmo já tive num passado bem remoto, felizmente, um ou outro deslize desta natureza que alguns anos de análise facilmente colocaram no devido lugar). Conhecemos também algumas figuras cujo histórico é de contínuo desequilibro. Quem nunca ouviu falar do regente grosseirão... Ok. Não preciso dizer mais nada, pois todos têm na ponta da língua, uma meia dúzia de estúpidos em ordem decrescente de grandeza.  Diretores, cantores, produtores, secretários de cultura, sem exceção, todas as categorias são privilegiadas - e isto é uma ironia - por estas figuras inexplicáveis. 


Recentemente, um conhecido, sujeitinho bem ordinário, me fez várias ameaças porque ousei achar um seu projeto irresponsável artísticamente e medíocre. E olhe que não me proponho a fazer crítica da arte, ou coisa parecida, tendo apenas emitido minha opinião à época (não altero uma palavra do que disse e estou em condições de acrescer algumas vírgulas). Claro que não me refiro ao sujeitinho por causa do seu tamanho (nada tenho contra baixinhos barrigudinhos, já que não levo em conta as pessoas por suas características físicas). O sujeitinho do texto é a referência à pequenez das suas intenções e a correlação inversa da sua medíocre truculência. 


Pois bem, antes que digam que este post foi colocado para "passar recados" - o que seria uma prática truculenta - faço um habeas corpus preventivo** ressaltando que o objetivo é levantar mais um dilema: aquele  que ainda não nos indicou uma maneira de rejeitar estes corpos estranhos na arte.


A fala do Barretão pelo menos serviu para algumas coisas: para refletir sobre estes comportamentos, para lembrar que é da natureza dos cargos políticos a substituição de pessoas, mas sobretudo reforçar a idéia de que - como no caso do Ministério da Cultura - é preciso manter as conquistas e as formas de diálogo e transparência que as viabilizam. 


* Se você não entendeu o porque da foto, dê uma olhada no Dilemas nº 49
**em lembrança ao Marcos e Gabriel 

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (49)


Onde o Barretão põe a mão alguma coisa está sendo feita para beneficiar... o Barretão. Isto está em qualquer cartilha de quem faz cinema. 

Não gosto, por princípio, das apologias pessoais porque aprendi que as forças que movem a Roda dos Ungidos na política possuem lógica própria, sendo muito grandes e díspares. Não vejo, portanto, com bons olhos os movimentos a favor e menos ainda os contra. 

Explico. Quando vi no passado movimentos a favor da permanência de alguém em algum cargo público, o resultado nunca foi bom para o pretendido. A rigor o único a sofrer era o próprio. Mesmo aqueles que se colocam no topo das listas, perderam pelos excessos de vaidade ou coisa que o valha. Sempre foi deste jeito. 

Da mesma maneira, quando se vê unanimidades como é o caso do Ministro Juca Ferreira, olho com mais cisma ainda para os que são contra. 

É inegável que o Ministério da Cultura teve em Gilberto Gil como titular, um interlocutor importante para pautar as agendas. E Juca Ferreira, primeiro na retaguarda, depois à frente do processo como Ministro, promoveu grandes avanços. 

Impossível não creditar os êxitos ao Juca e à equipe. Nas vezes que o ouvi e conversas que tivemos, sempre francas, abertas, ficou clara a disposição de negociar onde seria possível. Repito que os êxitos foram imensos, mesmo não sendo na velocidade que todos gostaríamos. A Cultura tem pressa. A Ópera tem pressa. 

Sempre será possível destruir alguma coisa pela crítica o que é péssimo quando os princípios não éticos passam a orientar o pensamento do crítico. 

Neste momento, estamos todos na expectativa de quem será o novo Ministro.

O Juca precisa ser Ministro? Claro que não e esta decisão caberá exclusivamente à Presidente eleita no xadrez de composição dos cargos. O Juca tem espaços enormes a ocupar (até torço - por ele - para que ocupe um muito apropriado para seu perfil e um enorme desafio, caso ele não continue em Brasilia). 

Combinemos então - se esta mudança é inevitável, necessária, politicamente insustentável ou coisa que o valha, que se mude o Ministro (cuja contribuição é inestimável, reconhecida), mas que não se mude o Ministério. Em sã consciência não há quem não queira que o Ministério da Cultura e as políticas para o setor sejam consolidadas naquele muito que já é consenso e aperfeiçoadas onde seja necessário. Vejam que no caso da Ópera e da Música Erudita, onde mantenho meu foco pessoal, é preciso estruturar todo o processo, começando praticamente do 1 (ou do 2). 

Amanhã, 8 de Dezembro, a Música se encontra em Belo Horizonte para a Feira Nacional do setor. Estarei lá.

Hoje, dia 7, o Barretão, com seu depoimento na Folha, coloca-se na contramão da história e nos faz a revelação surpreendente (preconceituosa) de que é contra a cultura de salão (sic) como denomina a prática do MinC. Certamente misturando conceitos, propôs que a indústria cultural passe a ser alçada da Indústria e Comércio, algo assim como levar bancos de imagens e bancos de sangue para a Febraban. Não fiz nenhum esforço para entender o que o ilustre pretendeu dizer, mas senti um cheiro de mofo, daquele cheiro da cultura dos porões, ou dos sótãos onde os macaquinhos cresceram, se deformaram e viraram godzillas. 

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (48)





Em 23 de Dezembro de 2002 escrevi o artigo abaixo. Lá se vão oito anos.
Não mexi uma vírgula do texto original e, como num jogo dos sete erros, proponho que o texto seja lido, revisto e o que de fato mudou e esteja em funcionamento seja apontado como tal. 


Cultura, essa pedra no sapato.
Ao contrário do que se apregoa ser este um país dotado de imensa vocação cultural, é com reticências de bastidor que se avaliam os cenários da atividade para os próximos anos. Tanto é assim que o pouco que se sabe do futuro são idéias generalistas a menos de 10 dias para posse de novos governos. Patinha feia, órfã indesejada, prima pobre de organismos de maior orçamento, sabe-se que a Cultura tem pouco dinheiro no chamado orçamentário da União, Estados e Municípios.
Os orçamentos somente são pequenos por equívoco de posicionamento e falta de visão de conjunto da realidade da própria cultura. É fácil para um governante alegar faltas de verbas pelas urgências sociais como se fosse um instrumento dissociado da política de desenvolvimento. É comum questionar-se salário de músicos se comparados à necessidade de remédios. Para que editar livro, se precisamos de merenda? Porque dar bolsa para um artista plástico, se precisamos de uniforme? Para que desapropriar um prédio importante do patrimônio, se o assentamento na reforma agrária é mais urgente? 
Nesta linha e com desculpas inomináveis são engavetados projetos de fomento, investimentos urgentes e fundamentais para a mudança de patamar da Cultura encarada como atividade supérflua por pura ignorância. Tão triste quanto isto é a ausência de um projeto político claramente discutido.
Ainda que existam bases para discussão e prática, está distante o entendimento de que Cultura é via prioritária de desenvolvimento o que significa ser encarada como atividade de caráter estratégico para gerar empregos, ampliar receitas para o Estado, ampliar a consciência de cidadania, auxiliar a afirmação da identidade, inserir a produção cultural no mercado global e ampliar a visão de mundo da população. A Cultura gera empregos diretos (artistas, produtores, técnicos) e indiretos (transporte, alimentação, serviços, comércio, trade turístico); amplia receitas com os pagamentos de impostos relativos, com a entrada de divisas (circulação no próprio país e exportação para o exterior) gerando renda; é parâmetro de identidade e reconhecimento da participação na coletividade, no sentimento de união patriótica, na valorização dos bens individuais e coletivos.
A inserção da produção no mercado global favorece o reconhecimento das características culturais e receptivas do país (estados e municípios por extensão) para turismo de captação, ao mesmo tempo em que amplia os horizontes e possibilidades da população por via referencial.
Estas já seriam razões suficientes para repensar os volumes de recursos disponíveis para o setor. Entretanto temos avançado pouco até por conta de uma visão limitada da origem e aplicação destes mesmos recursos já que não há uma integração da Cultura no complexo de prioridades do Estado que a enxerga como uma maneira de “agradar artistas”. Afora a manutenção das atividades meio (administração) é fundamental dotar a gestão da Cultura de recursos que permitam sustentar as atividades-fim. Estas devem contemplar obrigatoriamente a ocupação dos equipamentos destinados à cultura, ao fomento de atividades nos vários segmentos (teatro, ópera, dança, música, artes plásticas, artes integradas, arte popular, humanidades, artes audiovisuais) criando-se mecanismos de aperfeiçoamento profissional e formação através de bolsas, programas de intercâmbio, política de restauro, manutenção de patrimônio histórico entre outros. 
A Cultura não pode ser tratada como um corpo estranho e isolado do conjunto de outras atividades do Governo em quaisquer dos níveis da Federação, nem dissociada da participação do Congresso e Senado na busca de soluções objetivas. Apenas para simplificar e no que parece mais óbvio, deve atuar de forma integrada, por exemplo, aos organismos de Educação e Turismo para que no mínimo aqui os benefícios visíveis estejam correlacionados. Para obter sucesso, o Estado deve realizar todos os esforços para viabilizar recursos de fontes patrocinadoras para a produção cultural tais como empresas privadas, entidades internacionais, programas de financiamento entre outros. Da mesma maneira, implementar a participação coletiva no processo. Nos programas de incentivo, por exemplo na lei federal, nos limites negociados com a Receita, poder-se-ia criar um mecanismo que permitisse à pessoa física destinar um percentual do seu imposto a pagar para determinado segmento da cultura de sua escolha. Estes valores constituiriam um fundo de fomento (ou acrescidos ao próprio FNC-Fundo Nacional de Cultura) no orçamento da Secretaria responsável pela área escolhida pelos contribuintes. Da mesma maneira, as empresas que não têm volume de imposto a pagar suficientes para patrocinar projetos, não têm vocação ou acesso para utilizar este mecanismo não poderiam também destinar parte do seu imposto para áreas de sua simpatia? Não seria este um mecanismo democrático e de formação de cidadania num segmento de importância estratégica? Não seria este um dos parâmetros para que se definam em que segmentos carentes de recursos, interesse mercadológico ou de visibilidade junto à população o Governo deveria investir? Ainda falando da lei federal, não seria mais democrático se empresas que detém seus institutos próprios fossem obrigadas a investir parte dos recursos incentivados nos programas públicos e na produção privada atuando fora de suas instalações? Não seria mais lógico deixar que a palavra patrocínio fosse usada apenas quando se tratam de recursos não incentivados, retornando ao mercado o diferencial tão importante para as empresas realmente patrocinadoras?
Mas deve ficar a Cultura apenas limitada a esta lógica? Obviamente não. Muitos produtos culturais podem ser realizados sob critérios de administração que permitam seu financiamento, retorno para investidores privados, sob incentivos para exportação e, nestes casos, deve o Governo apoiar o desenvolvimento de bancos de negócios, formação de agentes, programas apoiados por política de turismo, entre outros mecanismos. Outro aspecto importante é o fomento à criação e produção, aqui incluindo a formação de mão de obra técnica e artística. Nesta direção, a política de patrimônio e sua ocupação sustentada podem ser um alicerce importante para o surgimento de novos núcleos produtores nas artes e, nesta matéria, cabe ao Estado buscar e apoiar a busca de recursos para que as manifestações culturais inclusive étnicas possam ser abrigadas e sustentáveis. Se no âmbito da gestão dos Estados e Municípios ainda não se informatizaram bilheterias, não se criou regularidade de produção e de programação anunciada antecipadamente, não se modernizaram os conceitos de gestão, não se estabeleceram parcerias com produtores privados, não se ampliaram os programas de assinaturas, de participação coletiva em grupos de mecenato, são estes os pontos de partida urgentes.
 Em termos objetivos isto basta? Também não. A circulação de produtos culturais e acesso aos bens de raiz precisam ser democratizados e para isto devem ser utilizados todos os recursos tecnológicos disponíveis. As ações culturais devem ter desdobramentos, disponibilizadas regularmente através dos meios de comunicação; devem ser estabelecidos critérios para a circulação de teatro, ópera, dança; criar e manter orquestras em associação com entidades, associações, núcleos; privilegiadas as artes em produção nos Estados e municípios, sendo estimuladas as artes potenciais a partir de núcleos primários existentes ou da sua difusão através de exposições, reproduções, uso de tecnologia; as artes plásticas devem ser apoiadas com a ampliação e criação de pólos regionais de circulação e salas receptivas; a arte popular deve incentivada ao cooperativismo e associação a estruturas de turismo na comercialização regional e difusão externa; são urgentes os mecanismos para distribuição do cinema nacional, inclusive estimulando a criação de cineclubes (privados, cooperados ou até no âmbito dos próprios equipamentos do estado); estabelecer mecanismos para que oficinas culturais tenham atividade regular nas áreas do conhecimento e de forma a que estes núcleos de fato formem mão de obra; o pensamento deve ser difundido sob todas as formas possíveis (palestras transmitidas por satélite, edição de livros, seminários etc) em convênio com universidades, entidades sociais etc.; a preservação do patrimônio deve receber todo o estímulo do estado, sem paternalismos quando patrimônio privado, com rigor quando patrimônio do próprio estado, tendo como principal orientação a ocupação destes espaços, mantidas suas características e vocações originais ou adaptando-as a ocupações correlatas, de forma a preservar a memória geopolítica, histórica e artística; promover a circulação de bens priorizando facilidades para escolas, educadores e idosos; estabelecer política de circulação para o exterior estabelecida  em conjunto com a política de turismo.
A circulação de bens deve ser um mecanismo consciente em todas as esferas e as políticas públicas neste segmento têm que ser prioridade em todas as áreas do poder econômico, sejam associadas aos programas de exportação de produtos industriais e manufaturados, sejam aos programas de turismo, programas de tecnologia e outros.
A presença do Estado é inevitável e é na prática associativa com a produção cultural e na sinergia destas forças decorrentes que quaisquer mobilizações farão sentido para o futuro. A difusão do conhecimento deve ser encarada como rotina e o Estado deve fazer todos os esforços para que a população entenda que ele está a serviço da Cultura e não o inverso que é risco de cairmos no populismo demagógico. A partir daqui é necessário que se enxergue a Cultura e o direito ao acesso à informação cultural como necessidade elementar. A cultura, no extremo, deve ser entendida como indústria limpa que depende do potencial criativo do homem e para tanto deve ser desenvolvida e incentivada. Para isto precisa ser tratada com planejamento, decisão, objetivos e metas. Caso contrário, será por mais tempo uma pedra indesejada no sapato.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Carlos Gomes no Mapa do Brasil (30)

Berlim virtual (*)

Quando comentei ontem no Facebook que hoje era dia de Carlos Gomes no Mapa do Brasil, questionando para onde seria a nova viagem a querida amiga e cantora Silvia Klein, no mineirês característico, brincou dizendo: "Berlim, uai...", obviamente puxando a sardinha para a cidade onde mora. 

Aceito o desafio, fui para Berlim, Silvia, e entre strasses e platz fuçei sem êxito. De antemão sabia que dificilmente teríamos uma homenagem desta natureza a Carlos Gomes em Berlim. Não há dúvidas quanto às proximidades de Gomes com os compositores alemães, notadamente Wagner, mas daí a ter seu nome cravado num bracinho de rua, numa vielinha sequer, a distância é grande. Não que lhe faltassem méritos para isto, talvez faltem ruas. Melhor pensar assim.

De todo modo, desafio é desafio. Pelo menos aqui no Brasil não faltam referências. Pensando assim, lá fui de novo para Berlim. Desta vez em Goiânia, onde temos duas Berlim: a rua e a avenida. Ambas na região sul da cidade em contraponto com a Rua Carlos Gomes na periferia norte. 

Pelo menos em Goiânia, Berlim e Carlos Gomes estão juntas. 

Como isto tudo é aprendizado sobre o Brasil, mantendo viva a memória de Gomes, aprendi mais uma: na região metropolitana de Goiânia, no município de Aparecida de Goiânia - uma cidade com 570.000 habitantes, há uns dois quilômetros da Avenida Berlim, em Goiânia, está a Avenida Carlos Gomes. 

Aí está. Duas cidades praticamente uma dentro da outra, com Rua e Avenida homenageando Gomes, distantes de Silvia e Stephen, mas próximos de Berlim - pelo menos da Rua e também Avenida.

(*) você pode fazer uma visita virtual a Berlim através do Google Earth em imagens 3D da cidade como esta acima. 

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (47)

A bola de Cristal (com a caveira) - 1902
John William Waterhouse

Nestes próximos dias serão definidos quais serão os Secretários de Cultura dos Estados e o Ministro da Cultura. Como conseqüência disto, todos aqueles que trabalham em escala nacional ou mesmo apenas nos Estados renovarão suas esperanças de colocar em prática os seus projetos.
Este é provavelmente o mais complexo Dilema Contemporâneo da Cultura porque não há nenhuma garantia de continuidade dos programas até aqui implantados ou mesmo perspectivas concretas de melhoria no cenário da produção cultural. Em resumo, não há garantia de que haverá investimento concreto na produção cultural favorecendo o desenvolvimento de idéias em programas de formação e de difusão da artes. Somente o tempo nos dirá.
Pode parecer vago, mas enquanto nada acontece, vamos nos dedicar a este 47 º Dilema. Isto mesmo, são 47 textos propondo discussões na Cultura. 
Nada mais concreto que a ausência de qualquer certeza e quando caímos no reino da especulação, nada melhor do que uma olhada nos oráculos. Pelo menos ali podemos encontrar respostas ou nos divertirmos um pouco.
Vejamos: 4+7= 11. Muito bem. Os dois 1 somados dão 2. Portanto, temos um par de 1 e um número 2 neste simbólico Dilema.
Pitágoras foi um pensador importante por configurar a matemática para os séculos seguintes a ele. Segundo Nicômaco, os números devem ser estudados à luz da Aritmologia (estudo metafísico, filosófico dos números) e da Aritmética que trata do estudos científicos e abstratos, absorvendo inclusive uma técnica (Cálculo) que permite avançar na concretude dos números. Confuso? Nem tanto. A coisa pode ficar mais complicada se associarmos o 2, por exemplo, ao conflito original da dualidade. O 2 é eco, reflexo, conflito, contraposição e Imobilidade momentânea que se produz quando as forças opostas são iguais. Atribui-se a Moderato de Cádiz, matemático espanhol, esta certeza velada: “O 1 a idéia de identidade, de unidade, de acordo e simpatia no Mundo; o 2 a idéia do ‘outro’, a discriminação e a desigualdade.” 
Se ficarmos nesta linha, podemos dizer que com o 2 (do 47), estamos "lascados". Mas, como todo oráculo tem seu lado "A" e o seu "B" (observe que os oráculos são regidos pelo 2), temos que pensar nos aspectos negativos e positivos do número
Os aspectos negativos do nº 2 são a dúvida, submissão, passividade, dependência e insegurança. Em se tratando de Cultura, isto é péssimo.
Já os positivos nos dão certo alento: tato, diplomacia, paciência, cooperação e companheirismo. Melhorou muito e este é o 2 que queremos...
Os números mestres (aqueles que vêm aos pares) nos dão outras informações. Vejamos o 11.
Seus aspectos negativos são a desonestidade, fanatismo, mesquinhez, desorientação e preguiça. Os positivos intuição, simpatia, paciência, perfeccionismo, humanitarismo, espiritualidade e percepção.
Na bíblia o 2 é o par perfeito. Dos animais puros, Noé levará para a arca sempre pares (Gn 7,2).  E perfeição é o que precisamos.
De um modo ou de outro, fica a dica: vamos ficar de olho, porque tudo pode ser o que quisermos que seja. 
Dois dedos cruzados, um galhinho de arruda atrás da orelha e um vazinho de espada de São Jorge podem ajudar.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (46)

La traversée difficile
René Magritte - 1926

Em continuidade ao post anterior e na esteira do comentário do Gabriel, vale ressaltar a proposta de formação de gestores em patamar universitário. 

Ora, um dos aspectos críticos é a falta de profissionais com formação na área da Cultura. 

Parece óbvio que um jovem de 22 anos recém formado em qualquer área de atividade não terá condições de assumir cargos de alta gerência imediatamente ao sair de sua faculdade sem um dose, digamos, fatal de risco. Isto não significa que este jovem profissional não tenha idéias boas e que não tenha condições de passar pelos processos de gerenciamento da sua atividade fim. Aliás, espera-se isto mesmo com as encubadoras universitárias, com laboratórios de gestão, estágios e outras soluções de mercado. 

A atividade cultural é muito elástica no seu escopo. Como se tratam de práticas próprias do comportamento humano, com fortes componentes de planejamento quando se trata de desenvolver políticas e programas, de pesquisa, das relações socio-políticas, dos efeitos da história na formação das sociedades e outros fatores além dos artísticos, é natural que a Cultura seja ainda gerenciada nos escalões superiores, por profissionais de múltiplas formações. 

É nesta hora que se dá o hiato já que não podemos supor que um engenheiro, um advogado, uma socióloga, historiadora ou agrônoma brilhantes na sua vida profissional e com múltiplos interesses na área da Cultura sejam capazes de trazer sua experiência, maturidade, conhecimentos científicos e vivências pessoais como futuros gestores sem pagar (e nos fazer pagar) alto preço por esta proeza, 

No entanto - observe-se que não estou tratando de nenhuma reserva de mercado - acho perfeitamente possível que cursos possam capacitar estes profissionais a assumir a gestão de áreas da Cultura. Permanece a ressalva de que a estes cursos não basta uniformizar a linguagem sob o ponto de vista da história, geopolítica etc., mas também é fundamental que se dê uma visão de aspectos práticos da operação dos equipamentos artísticos, da linguagem da área. dos riscos e problemas de gerenciamento entre outros aspectos. Infelizmente, não existem manuais práticos como nas rotinas de auditoria ou coisa parecida e esta é uma das razões da necessidade de se pensar esta área com mais cuidado.

Esta resposta deve ser trazida para a sociedade pelo mercado o mais breve possível.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (45)



A falta de mão de obra qualificada é um fator de inibição para o crescimento do país que se obriga a fabricar técnicos em série para suprir as mais diversas necessidades. 

Na Cultura não é diferente e faltam generalistas - gestores que tenham a visão global dos processos culturais e que conheçam as linguagens e distinções técnicas.

Não é que que os profissionais da área devam conhecer tudo. Não se trata disto, mas quando um espetáculo entra num teatro o que se espera é que os gestores daquele equipamento conheçam a linguagem relativa àquela atividade. O que se depara muitas vezes na prática é que pessoas com habilidades ou conhecimentos relacionados à determinada atividade seja empossados em determinados cargos sem a qualificação técnica (e conhecimento artístico) necessário para cumprir adequadamente seu papel.

Geralmente, um bom técnico em determinada área - e isto é apenas um exemplo - não reúne as características necessárias para administrar um teatro por mais qualificado que seja para gerenciar a sua própria atividade. Perde-se um tempo enorme para se obter os resultados e a visão do conjunto necessária para uma boa gestão.

Sofre-se também com a promoção de pessoas em determinados patamares para outros para os quais não estão absolutamente preparados. É o caso de um produtor que é promovido a diretor de um determinado espaço cultural sem a devida experiência ou qualificação, um aderecista que se torna figurinista porque leva jeito... Há poucos dias, ouvi uma explanação de um excelente designer de luz para um novo assistente. Dizia ele: "você é muito jovem e está começando na área. Primeiro, você precisa carregar estes equipamentos. Se você gostar e desejar, daqui a pouco irá subir nas escadas e pendurar refletores nas varas de luz, depois aprenderá a afinar, mais tarde a anotar e fazer os mapas de luz, depois operar e, quem sabe um dia, se você estudar e se dedicar muito, você aprenderá a desenhar a luz e assinar o trabalho, entendendo os fundamentos do teatro, as teorias de cor, as necessidades. Mas se você for um bom técnico já será suficiente e um caminho importante para a vida toda". Sábio e óbvio, não é? Mas o gestor precisa conhecer este caminho e especificidade para não errar na avaliação dos profissionais com quem trabalho. Um bom técnico não é um bom iluminador, da mesma maneira que um bom iluminador não é um bom diretor de palco.

Um diletante de música, por mais conhecedor que seja da história do gênero a que dedicou boa parcela de sua vida, não possui os conhecimentos necessários para transformá-lo em profissional da área. Comprar quadros, ir a museus, freqüentar shows de rock, gostar de ler poesias, colecionar dvds de ópera, estudar piano em casa, ir a teatro, ser assinante das mostras de cinema, não transforma as pessoas em pintores, marchands, poetas, diretores de teatro, pianistas de concerto, cineastas ou mesmo em críticos de qualquer destas atividades artísticas e, menos ainda, em gestores de pinacotecas, teatros, centros culturais, entidades de formação e difusão. Geralmente estas pessoas são excelentes conhecedores da atividade que exercitam para seu próprio prazer, mas isto não os credencia para mais nada além disto. Poderiam, sim, a partir deste conhecimento preliminar, investir tempo e recursos no aprendizado de atividades correlacionadas, mas geralmente abdicam desta prática pelo simples fato de que acham (ou são estimulados a achar) que o conhecimento acumulado nas suas vidas é suficiente para realizar o restante. 

Não existem ainda cursos em nível universitário dedicados à formação de gestores com esta visão de interesse prático. 

Enquanto escrevo este post lembrei de uma situação "engraçada" em que gestores de várias áreas reunidos não conseguiam conceituar adequadamente um assunto específico da área da cultura sem perderem um tempo enorme negociando o que é Linha do Horizonte* que nada tem a ver com skyline e nem com o horizonte que vemos numa determinada paisagem. 

Neste tema não dá para manter o bom humor.




(*) - A Perspectiva Real – também conhecida como Fotográfica – é uma regra utilizada para se representar os objetos, construções, figuras e a natureza da maneira como são vistos pelo olho humano, em suas formas tridimensionais. 
Foi criada pelos arquitetos da Idade Média, que buscavam uma fórmula de representar os seus projetos de maneira mais realista possível.A regra consiste em situar uma linha imaginária (Linha do Horizonte) à altura dos olhos do observador, definindo, assim a sua posição em relação ao objeto ou cena observada; tudo que está abaixo da linha do horizonte é visto de cima para baixo; aquilo que está acima da linha é visto de baixo para cima e quando o objeto está localizado sobre a linha do horizonte, ou seja, no mesmo nível dos olhos do observador, não é possível enxergar nem a parte de cima nem a parte de baixo.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Nota de Rodapé (11)



Acaba de ser aprovado o Plano Nacional de Cultura pelo Congresso. O Plano será agora encaminhado para sanção presidencial e, a partir daí , colocado em prática.

Vale acompanhar a regulamentação e as várias possibilidades que se apresentam nesta nova fase que certamente ainda irá provocar discussões, principalmente no que se refere à aplicação das novas regras da Lei Rouanet.

A expectativa da produção cultural é a maneira concreta como será utilizado o Fundo Nacional de Cultura e o acesso aos recursos disponibilizados, inclusive os critérios de utilização dos recursos  da PEC 150 que prevê a fixação mínima de orçamento da Cultura nos governos Federal, Estaduais e Municipais na ordem de 2,5%, 1,5% e 1% respectivamente.

É um passo importante por trazer uma perspectiva de avanço na atividade cultural, principalmente nas artes eruditas que tiveram atenção em menor escala nos últimos anos.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Viva a Ópera (8)

foto by João Guerrra/UOL

A estudante de Elisa Delfino garantiu um lugar próximo do palco após mais de 3 dias na fila para compra de ingressos. 
Não satisfeita, ergueu um cartaz durante o show, com o pedido, em inglês, para receber do seu ídolo há mais de 15 anos (ela tem 18) um autógrafo que seria eternizado em forma de tatuagem.

Isto é ser fã. Apropriadamente uma redução de fanático, considerando este o limite extremo da admiração e do fervor. O fã tem um forte componente de irracionalidade e de culto extremado da própria individualidade, a ponto de achar que o artista está a ele ligado para sempre. 

Sem controvérsias e sem discussões sobre o quadro psicológico do idólatra como se pode supor, o fã é essencial para o artista na  medida em que lhe dá suporte e valoriza seu ego.

Ora, o artista é um ser especial por sua imensa auto-estima. Afinal, não é preciso tê-la muito em alta para subir num palco e acreditar-se capaz de agradar multidões?

Na ópera, no Brasil, há esboços aqui e ali de fãs deste ou daquele cantor além daqueles apaixonados pelos ídolos do passado. O fã não vê idade, mas fãs de ídolos vivos é bom até para o reconhecimento publico das atividades criativas. Nesta direção, os artistas da ópera têm muito a fazer para criar estas empatias. 

Mãos à obra. A ópera tem pressa. Viva a Ópera.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Carlos Gomes no Mapa do Brasil (29)

"Encontro" de Motos em Mangueirinha-PR

Diz a lenda nos anais de Santa Viquipídia que o melhor hotel da cidade tinha uma mangueira onde se podia deixar o gado “hospedado”. Daí o nome de Mangueirinha dado ao município que foi uma parada de tropeiros que faziam a rota Rio Grande do Sul para São Paulo.

É mais provável que naquelas paragens houvesse de fato um curral de pequeno porte para abrigar gado em trânsito e não um hotel como insinua o texto de referência citado acima. Não podemos esquecer que Mangueira ou Mangueiro é sinônimo de curral no Rio Grande do Sul.

No Paraná, vivem em torno de 11.000 índios, das etnias Kaingang, Guarani e Xetá, distribuídas em 23 áreas. Na reserva de Mangueirinha que compreende os municípios de Mangueirinha, Chopinzinho e Coronel Vivida, moram em torno de 400 familias com cerca de 2.000 pessoas, sendo esta a maior área indígena do Estado do Paraná. A questão indígena no Brasil é complexa e não são poucas as referências de problemas na manutenção da reserva. O cineasta paranaense Sérgio Bianchi fez um documentário importante sobre o tema. Confira 

Enquanto isto, em Mangueirinhas, cruzando a Rua Castro Alves, mais uma homenagem ao compositor que dá nome à Rua Carlos Gomes.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (44)


Na pág 68 da edição impressa da Revista Veja desta semana publica-se a relação dos Ministérios e os partidos da base aliada que os "controlam" e aqueles que "cobiçam" mudanças nos seus comandos. 


O Ministério da Cultura não participa do "bolo". 


No mais puro estilo Poliana, os sapos da lagoa abririam o bocão e diriam "Obaaaaaa... O Ministério da Cultura é livre de interesses partidários, estruturas de poder, uso da máquina, interesses financeiros...".


Infelizmente, administrar a Cultura não é do interesse dos partidos e as manifestações a favor são pontuais, por interesse deste ou daquele político que enxerga na atividade algum tipo de afinidade.


Apesar da abrangência, do significado social, da importância para o futuro o abandono político da Cultura ainda persiste e não despertou a voracidade e imediatismo dos partidos. 

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Nota de Rodapé (10)

Angeli e as eleições


Não importa se a favor ou contra este ou aquela, mas quanto mais se lê a opinião de especialistas a respeito das pesquisas eleitorais, mais convencidos ficamos de que há uma distorção grave nos métodos de coleta de dados e de análise. 

Ao olharmos as graves distorções nas pesquisas sobre os candidatos ao senado em São Paulo, é impossível confiar ou prever o quanto erraram até aqui nas pesquisas de grau de aceitação do governo federal, por exemplo, ou eleições para prefeito, vereadores? 

É impossível medir o mal que estes resultados fazem para a democracia. Imagine a pressão que deve ter sofrido o governador eleito Beto Richa do Paraná para tomar a decisão de exigir na justiça a não publicação das pesquisas? Justo ele cujo partido se posiciona como social democrata? Isto não significa que devamos concordar com a censura, mas, se olharmos os resultados do primeiro turno e as ilações possíveis a partir disto, a democracia está ameaçada e por uma de suas ferramentas mais elementares.

Vários especialistas na área falam que o sistema de cotas usados pelos institutos são inadequados e produzem distorções. Nos Estados Unidos, o sistema de cotas foi deixado de lado para pesquisas eleitorais, apesar de mais barato, deste a década de 40 do século passado.  

O que dizer agora do segundo turno? O que dizer da possível influência no resultado se os números atuais estiverem errados? Se os institutos insistem em dar tiros no pé, é um problema deles, mas quando se coloca em dúvida a extensão e gravidade dos resultados a partir destas distorções, passa a ser um problema nosso.

Nota de Rodapé (9)

Filhote de porco-espinho

Leia a nota de Rodapé (8) e vamos continuar aumentando a lista.


O porco-espinho é bonitinho... mas cutuca.