quinta-feira, 17 de março de 2011
Nota de Rodapé (14)
Hoje foi publicado no Cultura e Mercado texto em que comento a recente polêmica acerca do blog da Maria Bethânia.
Dilemas Contemporâneos da Cultura (63)
charge por João Montanaro
publicada no Jornal A Folha de São Paulo 12/03/2011
Republicada hoje na capa da Ilustrada (Jornal Folha de São Paulo) a charge do jovem cartunista João Montanaro(14 anos) ganhou destaque por provocar reações insólitas.
Originalmente, a charge foi publicada na edição de sábado (12/3) e recebeu várias queixas dos leitores. O garoto chegou a ser chamado de "babaca" por colegas da escola onde estuda.
Montanaro desenhou uma onda enorme carregando destroços de uma cidade. Reproduziu aquilo que à exaustão os canais de televisão, You Tube e outros endereços exibem. Porém teve um cuidado: seu desenho só não é um rabisco qualquer porque, de forma inteligente, copiou uma xilogravura de Katsuchika Hokusai cujo título original em tradução livre seria algo como A concavidade do abismo - Onda do Mar de Kanagawa. Nada mais simbólico para o que ocorre no Japão.
Não satisfeito entretanto, Montanaro põe um título: Xilogravuras japonesas - A onda, um lembrete aos desavisados.
Isto não bastou. Mesmo assim, a leitura rasa prevaleceu. Redundam as críticas raivosas, ignorantes, com ódio.
Precisamos rapidamente criar mecanismos para reduzir o analfabetismo funcional - aquele em que o indivíduo lê sem a capacidade de discernir e criticar com solidez de argumentos o que está lendo, e, ao mesmo tempo, ampliar a alfabetização para as artes.
Tema grave. Dia destes vão processar o rapaz por plágio.
quarta-feira, 16 de março de 2011
Dilemas Contemporâneos da Cultura (62)
À recente polêmica envolvendo a OSB juntam-se várias opiniões e artigos.
Trata-se de uma situação delicada, sujeita a vários pontos de vista, não se tratando apenas da observação de direitos e deveres, do poder de mando, ou da discussão do que cabe no modelo privado da Fundação.
A névoa das audições - é só uma névoa - está em primeiro plano, porque o estabelecimento de critérios e formas de avaliação é muito mais difícil do que parece. A essência desta discussão está nas relações de trabalho, do trabalho artístico, mas mais do que isto, concentra-se no novo modelo, em que as relações de poder mudaram radicalmente.
Já há algum tempo venho sinalizando aqui a necessidade de novos protocolos para a gestão na Cultura. Inevitavelmente, as orquestras brasileiras deverão passar por estas mudanças.
Afinal, estamos tratando de uma necessidade premente de valorizar os profissionais da área cultural e isto exige a adoção de novos mecanismos. Vejam bem: necessidade de valorizar os profissionais e não o contrário. Neste entendimento, trata-se de estabelecer novos modus operandi que permitam melhor definição dos níveis de qualidade, dos objetivos de curto, médio e longo prazo, processos negociados de estabelecimento de metas.
Para alguns pode parecer uma posição conservadora, mas não vejo outra saída que não a negociação entre as partes. A construção do processo a partir do diálogo é mais difícil, exaustivo, demorado até, mas é o que consolida.
Tudo funcionará bem se os dois lados perderem o suficiente.
Parece uma afirmação insólita? Pode ser, mas observe à sua volta: o que de duradouro existe que não tenha sido através de um longo amadurecimento? Você verá que é tudo assim. Mesmo quando se trata de uma nova ferramenta de internet, por exemplo, sua consolidação se dá ao longo do tempo e a partir do esforço de muita gente.
quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011
Dilemas Contemporâneos da Cultura (61)
Conversava hoje com o administrador de um teatro numa das belas e interessantes cidades no interior do Estado de São Paulo.
"Um dos problemas mais graves que temos - disse ele - é quando certas "estrelas" do teatro se apresentam aqui. Alguns entram no teatro e se portam como donos, impedem a circulação dos nossos profissionais, assumem o controle e não podemos fazer nada porque é um problema da pauta, é um nome importante".
Comentei com ele que esta é uma questão inadmissível e é uma questão de conceito.
O teatro (os teatros) público está a serviço da comunidade na medida em que facilita o acesso à informação cultural. Ao mesmo tempo, está também a serviço dos artistas que o utilizam e para tal, precisa cumprir uma série de requisitos (instalações, limpeza, gestão etc.).
Mas está a serviço e não servil a nenhuma das partes. Tanto a comunidade quanto os artistas têm o equipamento a seu dispor dentro de determinadas regras.
Cabe ao público comparecer, pagar ou não seus ingressos, utilizar adequadamente as instalações, obedecer às normas de segurança e preservação do espaço etc. Ao mesmo tempo, ao artista cumprir com suas obrigações contratuais, garantir a obediência as normas de segurança e regras de utilização etc. E ao teatro fazer com tanto um quanto o outro sejam satisfeitos nas suas demandas específicas, sempre levando em conta que a preservação deste bem público é condição de todo o processo.
Não parece simples? Pois é. Precisa ser simples.
(obs.: imagem www.omais.com)
quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011
Dilemas Contemporâneos da Cultura (60)
Maske
Escultura em casca de ovo de Alexander Volk (*)
Mas como dizer "não gostei" para algo que críticos, amigos, disseram que é "muito bom"?
Este é um dos dilemas mais complexos.
Um cantor "brega" vira cult se chamado a participar do show de uma estrela da MPB. Não é assim que história tem apresentado?
O fenômeno "não sei se posso gostar" não é recente. De um modo geral, são os chamados formadores de opinião que indicam o que é o bom da vez e as pessoas assimilam isto com relativa facilidade. Antes eram as gravadoras que diziam o que era bom em cada segmento da música. Hoje, com a multiplicidade de canais de difusão, os novos modelos de produção, o que é bom é determinado pelas redes.
Mesmo nestes casos, as pessoas ainda não sabem dizer se "podem" gostar disto ou daquilo. Só o fazem depois de se certificarem que suas referências também gostaram.
O que não deixa de ser um fenômeno engraçado, já que a possibilidade de escolha é uma direito individual transferido para o coletivo e não o inverso.
O 'não sei se posso gostar" está associado também a certa malícia. Muitas pessoas, por não quererem se expor frente aos seus grupos, preferem não omitir qualquer opinião até que tenham a certeza de que não serão diminuidas junto a seus pares. Nestes casos, o direito de opinião, não é respeitado ao pé da letra.
O que fazer?
Não se deixar enganar por estas falsas perspectivas coletivas, perceber o jogo de poder reduzido (isto mesmo: reduzido) a este contexto e deixar-se levar por suas próprias emoções.
Se, junto com isto, os "em dúvida" resolverem ler mais, se informar mais, ficará mais fácil rir com vontade, chorar de felicidade.
(*) Escultura em ovo é "brega", kitsch? E daí? Gostei.
terça-feira, 22 de fevereiro de 2011
Carlos Gomes no Mapa do Brasil (34)
Sombra da cruz sobre a lua cheia na igreja católica
Sagrado Coração na cidade de Klamath Falls em Oregon, Estados Unidos
Santo Abílio tornou-se santo por resistir à tortura. Por não renegar sua fé cristã, foi condenado ao martírio. Temos difíceis aqueles.
A tortura era feita para que o cristão concordasse em renegar publicamente a sua fé e a oferecer sacrifícios aos deuses romanos e as vezes eram feitas as escondidas em calabouços. Em geral as torturas eram suplícios terríveis, mas feitas de modo a não matar o torturado, e se ele cedesse era libertado e retornava para casa.
Segundo os martirologistas, somente uma pessoa santa e fé inabalável, poderia resistir ao martírio. Por isto os mártires da época com “Atos de Martírio” autênticos, são considerados santos sem passar todo o longo processo de beatificação e canonização.
A celebração de Santo Abílio é feita neste dia 22 de Fevereiro.
Nesta mesma data, Santa Margarida de Cortona é também relembrada. Nasceu em Laviano na Toscana, mas foi em Cortona onde viveu e veio a morrer. Por inúmeros pecados, Santa Margarida passou 22 anos em penitência. Sua história termina quando morre aos 48 anos (22/02/1297), sendo enterrada na Igreja da Ordem Terceira de São Francisco onde até hoje seu corpo está intacto. Margarida de Cortona foi incluída no Catálogo dos Santos em 1728 pelo papa Bento XIII.
Tanto são Santo Abílio quanto Santa Margarida são nomes de rua em São Paulo, na Zona Norte e perto da Rua Carlos Gomes no Tucuruvi.
Já São Maximiano - também relembrado no dia 22 de fevereiro - é também nome de rua, mas fica longe, do outro lado do rio Tietê, na Água Rasa.
São Lineu, outro santo comemorado no mesmo dia, não tem nome de rua em São Paulo.
Tanto são Santo Abílio quanto Santa Margarida são nomes de rua em São Paulo, na Zona Norte e perto da Rua Carlos Gomes no Tucuruvi.
Já São Maximiano - também relembrado no dia 22 de fevereiro - é também nome de rua, mas fica longe, do outro lado do rio Tietê, na Água Rasa.
São Lineu, outro santo comemorado no mesmo dia, não tem nome de rua em São Paulo.
segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011
Nota de Rodapé (13)
Festival Amazonas
capas dos programas dos quatro primeiros anos
Ao citar no texto o Maestro Luiz Fernando Malheiro como idealizador (sic) do Festival Amazonas de Ópera, Coelho lembrou-me outro artigo recente em que a história do início deste mesmo festival não ficou clara.
Vamos aos antigos fatos.
Desde 1990, buscávamos caminhos para a produção independente de teatro e ópera. Em 1994, já trabalhando ideias para o centenário de Carlos Gomes em 1996, criei um projeto que se materializaria com a exposição Carlos Gomes , Vida e Obra (2) e recitais itinerantes, a produção na Bulgária de três óperas de Carlos Gomes , sua gravação em Video e em CD, sua exibição nas TVs Educativas em rede nacional e circulação da ópera Fosca por três estados brasileiros.
Nossa ida à Bulgária foi consequência da falta de apoio dos teatros e governos que obtivéramos no Brasil. Tínhamos um banco patrocinador de origem italiana que se propôs a apoiar o projeto (3), buscamos alguns teatros na Itália, Portugal e Espanha que se dispusessem a fazer uma parceria conosco, o que se tornou inviável. Convidamos o maestro Júlio Medaglia para dirigir a primeira produção (Il Guarany) e, por sugestão dele, conversamos com a Opera Nacional de Sofia, onde estabelecemos as bases iniciais do programa. Eles entrariam com a mão de obra técnica, orquestra, coro e corpo de baile. Nós cuidaríamos dos recursos financeiros, da regência (sempre um brasileiro), dos projetos cenográficos, de figurinos e aprovaríamos (e indicaríamos) elenco, resultados etc. Também era nossa responsabilidade a gravação em sistema de broadcasting, edição de vídeos, sua exibição no Brasil, distribuição gratuita etc. Para o segundo título, convidamos o Maestro Isaac Karabtchevsky , então regente titular do Teatro Municipal de São Paulo, que, por inúmeros compromissos, não pode se comprometer com a continuidade do projeto. Seu assistente, o regente Luiz Fernando Malheiro, é convidado então para reger Fosca (novembro de 1997) que também a regeria em projeto da Funarte que acabou não acontecendo. No ano seguinte (novembro de 1998), Malheiro também rege a nossa versão de Maria Tudor.
Com nossos patrocinadores, trouxemos Fosca para São Paulo com toda a companhia de Sofia (cerca de 150 pessoas) em abril de 1998, inclusive a orquestra búlgara regida pelo mesmo maestro Malheiro, dividindo recitas com o regente titular da companhia. Com o apoio financeiro do Ministério da Cultura, através da Funarte – Fundação Nacional de Arte, levamos também o projeto para Manaus e Belém.
Em Manaus, encerrava-se o II Festival de Manaus – Opera, Música Sinfônica, Ballet & Jazz. Este festival foi, até onde nos consta, idealizado pelo violinista alemão Michael Jelden que com apoio do Governo do Estado e empresas locais conseguiu viabilizar os dois primeiros anos.
Neste mesmo ano, o Maestro Júlio Medaglia criara a Orquestra Amazonas Filarmônica, um velho sonho de Amazonino Mendes, o governador à época.
O Secretário de Cultura Robério Braga entusiasmado com os resultados de público de Fosca, com a organização e aspectos gerais artísticos e de produção, solicitou-me que estudasse a possibilidade de dar continuidade ao Festival de Manaus já que se encontrava insatisfeito com algumas características do projeto, tendo rompido com os gestores anteriores. Lembro-me ter relatado a ele que já estávamos estudando mecanismos para produzir um festival de ópera no Brasil e que seria excelente termos a oportunidade de reformular o festival existente, desde que não mais apresentássemos jazz, dança e outras atividades como o programa realizado até então. Faríamos se concentrássemos em Ópera. O Secretário Robério propôs que planejasse da maneira que me parecesse melhor, desde que tivéssemos resultados artísticos de qualidade, com visibilidade nacional e fora se possível.
Foi assim que em poucas semanas, apresentamos um projeto do I Festival Amazonas de Ópera que, por decisão do Secretário de Cultura, passou a ser o III Festival Amazonas de Ópera, unificado às iniciativas anteriores.
A Orquestra Amazonas Filarmônica, mantida pelo Governo do Estado, foi cedida por seus titulares (Maestro Júlio Medaglia em 1999 e Marcelo Stasi em 2000) para o Festival do qual fui o Diretor Geral nos dois primeiros anos e Rosana a Diretora de Produção. Malheiro assinou as direções musicais dos títulos que regeu. Netes dois anos que participamos o festival teve ainda Marcelo Fagerlande com seu grupo de câmara e o Maestro Karl Martin regendo um dos títulos.
As edições seguintes já não teriam nossa participação, com o Maestro Malheiro assumindo a titularidade da Orquestra Amazonas Filarmônica.
Em 2002, a convite do Governo do Estado do Pará, do então Secretário de Cultura Paulo Chaves , criamos e, nos anos seguintes, passamos a realizar, o Festival de Ópera do Theatro da Paz , em Belém, com vários intérpretes nacionais e internacionais à frente da Orquestra: Maestros(4) Júlio Medaglia, Patrick Shelley, Matheus Araújo, Barry Ford, Karl Martin , Henrique Lian, Abel Rocha , Sílvio Viegas, Flávio Florence, Roberto Duarte.
Estes fatos, somam-se ao texto de João Marcos Coelho ao concluir citando os “poderes extramusicais necessários para (o regente) trabalhar no pódio com alguma tranquilidade”.
Da mesma forma que o Festival Amazonas não foi iniciativa de um regente, mas de um Secretário de Cultura que detectou a necessidade de um salto de qualidade com novos parceiros, ou o Festival do Theatro da Paz , por orientação e visão de outro Secretário de Cultura, outras situações têm história semelhante:
a OSESP teve John Neschling , mas também o Secretário Marcos Mendonça , Roberto Minczuck, Cláudia Toni e vários colaboradores também importantíssimos para os resultados; o reconhecido Ira Levin conduziu a Orquestra do TMSP de forma brilhante, num momento muito particular, sob a gestão de Lúcia Camargo, com a série de Câmara do Henrique Lian, com o Ivo Rosseti arrumando recursos financeiros (além disto, quantas vezes não se buscou de graça, tecido para figurinos na sua fábrica?) e vários outros exemplos.
O próprio Neschling ao encerrar suas atividades na Cia de Ópera que acabara de criar, aponta problemas. Com isto o maestro, admite nas entrelinhas que não bastam o regente, a equipe teoricamente capaz que reuniu, o apoio financeiro e institucional que obteve do Ministério da Cultura, mas outros fatores que inviabilizaram a iniciativa como havia imaginado. Certamente, aspectos aparentemente simples, mas cruciais como o suporte adequado a tarefas tão necessárias ao desenvolvimento da Cultura.
Estes fatos e outros passam pouco a pouco para a arqueologia da ópera e da música erudita, mas não deixa de ser importante entender que – mesmo em condições desfavoráveis – no passado, vários gestores conseguiram bons resultados. O que não significa que os modelos anteriores de gestão sejam ainda adequados. Guardada a memória de pessoas e experiências positivas, preguemos a modernização de procedimentos, a visão global e convergente das atividades culturais, a preservação dos bens públicos, a ética, a transparência, a preservação do interesse coletivo.
O que se deseja de fato é que as gestões se profissionalizem, os administradores sejam sensíveis, que a cada vez mais tenham a visão do conjunto que, por exemplo, representa o TMSP onde convivem ópera, dança, escolas e museu, sem considerarmos os desdobramentos naturais e esperados de uma estrutura moderna e numa das maiores cidades do mundo.
Boa sorte ao maestro Abel Rocha e , parafraseando João Marcos Coelho , que os poderes extramusicais se unam a favor da música de qualidade.
(1) Analise publicada na edição de 16 de Fevereiro do jornal o Estado de São Paulo. Infelizmente não encontrei o link do texto integral.
(2) Recitais realizados em várias cidades. No lançamento, em Campinas, uma orquestra arregimentada foi conduzida pelo Maestro Diogo Pacheco, tendo Rosana Lamosa como solista. Os recitais itinerantes foram feitos com piano e vários solistas nacionais.
(3) o incentivo entusiasmado à realização do projeto e decisão de patrocínio foi de Gilberto Biojone , então executivo do Banco Sudameris.
(4) O maestro Ira Levin também participou do festival realizando um concerto como pianista.
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