segunda-feira, 22 de março de 2010

Carlos Gomes no mapa do Brasil (8)

Banda da Associação Lira Carlos Gomes
Estância - Sergipe - Brasil

É provável que o José Felix e Claudemiro Xisto tenham dormido pouco naquela noite. Às 5 da manhã do dia 3 de Outubro de 2010, o maestro Claudemiro já estava à frente da banda para iniciar as comemorações dos 130 anos da Associação Lira Carlos Gomes* que durariam o dia inteiro pelas ruas da cidade de Estância, no Estado de Sergipe.

Às 19 horas, foi celebrada uma missa na Igreja Nossa Senhora do Rosário e, em seguida, na sede da Associação, seu presidente José Felix e os demais sócios receberam os amigos para um coquetel em que todos projetaram os melhores desejos de continuidade para a banda, um dos orgulhos da cidade.

Tocar nas ruas de Estância em Sergipe é uma satisfação dos músicos da Lira Carlos Gomes.

Com toda a certeza, seria para eles motivo de muita satisfação poderem um dia tocar na Rua Carlos Gomes, na cidade de Estância Velha, no Rio Grande do Sul, onde os nomes se unem pela memória e reconhecimento ao compositor da ópera Salvador Rosa.

Estância Velha desenvolveu-se em torno do Rio dos Sinos com a instalação da Real Feitoria do Linho Cânhamo para a Coroa Portuguesa onde se produzia o cânhamo, matéria prima para os cordames dos navios. Como isto não deu muito certo, as terras acabaram distribuidas aos primeiros imigrantes alemães que chegaram ao Brasil e se instalaram inicialmente na cidade de São Leopoldo. Entre eles, Mathias Franzen - um sapateiro alemão - um dos pioneiros onde seria a cidade de Estancia, emancipada em 1959, deu origem à vocação de fabricar calçados da região.

E por falar em São Leopoldo, é bom lembrar que as primeiras 39 familias alemãs chegaram à cidade em 1824 formando o que se chamou de Colônia Alemã de São Leopoldo. A cidade é reconhecida como o marco inicial do Vale do Rio dos Sinos e, como seria natural imaginar, lá também a Banda de Estância no Estado de Sergipe, poderia se apresentar caminhando pela Rua Carlos Gomes, uma outra homenagem de São Leopoldo ao Tonico de Campinas - apelido pelo qual Gomes também foi conhecido.


*agradecimentos a Rossevanya Andrade, da Orquestra Sinfônica de Sergipe, que me contou e enviou material sobre a Associação Lira Carlos Gomes.

domingo, 21 de março de 2010

Dilemas contemporâneos da Cultura (5)

At The Opera
by Seymor Joseph Guy


Transcrevo aqui as palavras do prefeito Gilberto Kassab ao sancionar, na última sexta feira, dia 19/03/2010, a lei (publicada dia 22 no Diário Oficial) que concede isenção de pagamento de Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) às atividades de Cultura e de Lazer:

"A lei deve servir de referência para que possamos conquistar outras vitórias na área cultural. Os artistas precisam do apoio do Poder Público para desenvolver seus trabalhos e contribuir para a construção da cidade e da formação cultural das pessoas que vivem em São Paulo".

Desta maneira, a partir de hoje, estão isentos de pagar ISS os espetáculos teatrais, de dança, balé, ópera, concertos de música erudita e recitais de música, shows de artistas brasileiros, espetáculos circenses nacionais, bailes, desfiles (inclusive de blocos carnavalescos ou folclóricos), e exibição cinematográfica em cinemas situados fora de shopping centers. A lei não beneficia apresentações artísticas em bares, boates, danceterias, casas noturnas e não será estendida para artistas internacionais.


Esta é uma reinvidicação antiga do setor cultural em São Paulo.

A nova lei veio a calhar para a continuidade das proposições sobre o nosso "dilema".

Qual o papel adicional da produção cultural intrinseco às tarefas que já desenvolve para atingir seus fins no cenário projetável para os próximos anos? De que maneira se darão estas relações com o poder público?

Não há dúvida que prevalecerá o coletivo sobre o individuo. Isto significa que individualmente as pessoas (artistas, técnicos, agentes, produtores) deverão se organizar seja através de empresas individuais e cooperativas para que se consiga a regularidade fiscal. Em pouquissimo tempo, com a tecnologia de dados disponível, não haverá condições de se realizar nenhuma atividade sem a devida estatura jurídica. Isto significa fortalecimento do mercado e dos segmentos culturais.

Ao mesmo tempo, serão levados em conta os registros profissionais e esta exigência deverá ser universal. Da mesma maneira que músicos precisam apresentar o registro da Ordem, as demais atividades deverão passar por mecanismos semelhantes. Em alguns teatros nos grandes centros, exige-se o DRT e sindicalização para várias categorias.

Já é uma necessidade que os profissionais se organizem de forma coletiva através de Associações e Entidades representativas de classe.

O efeito práticos disto, se vê na nova lei do Isenção do ISS em São Paulo. Independente da sensibilidade do Governante para a questão, ela foi fruto de uma articulação entre várias entidades representativas das várias categorias com a Câmara Municipal e o próprio Executivo.
O resultado efetivo foi mais uma passo concreto e uma conquista para todos.

Em Março de 2009, algumas pessoas se reuniram e criamos a ACPOESP* - Associação dos Cantores e Profissionais de Ópera do Estado de São Paulo, uma entidade que, embora mantenha no nome o Estado em que foi criada, já possui membros associados de várias regiões Brasileiras e é aberta a cantores, músicos, técnicos, diretores, regentes e a todas as atividades relacionadas com o fazer operístico. O objetivo desta associação é promover o desenvolvimento profissional e a difusão do gênero de forma a fazer com a que ópera passe a integrar o discurso e agendas de governos e empresas.

Apresentei a ACPOESP como resultado desta nova dinâmica que já vem se estendendo a várias outras entidades.

O ponto de partida destas articulações está nos grupos primários de artistas nas cidades. Além do esforço individual, das categorias, o poder público precisa estar presente e estimular a formação destes coletivos uma vez que isto estimula a troca de experiências e facilita o diálogo, deixando a informalidade de lado.

O grande dilema contemporâneo da cultura é, como venho falando, encontrar formas de financiamento da atividade de forma a garantir o seu desenvolvimento sustentado e sustentável.

O primeiro passo é formalizar um segmento cuja aparência á a informalidade. Apenas a aparência.


*interessados em conhecer a ACPOESP podem se comunicar com o e-mail acpoesp@uol.com.br

quinta-feira, 18 de março de 2010

Dilemas contemporâneos da Cultura (4)

O Circo - Georges Seurat


Antes que o Joatan reclame com toda razão que minha visão de Cultura e dos seus dilemas são apenas resolvidos no âmbito do EStado, cabe antecipar a abrangência dos temas que pretendo abordar aqui. Na minha opinião, a Cultura não se resolve apenas na esfera estatal pela simples razão de se tratar de um complexo que envolve a criação artística, técnicos, entidades privadas, fornecedores de insumos e serviços, e os consumidores de bens culturais incluindo neste grupo empresas, entidades e pessoas físicas que os utilizam como forma de valorizar suas marcas, para cumprir estratégias de relacionamento, objetivos sociais e obter benefícios fiscais.

Mas vamos por assuntos e aos poucos.

É inegável a encessidade do Estado forte para garantir franquia de direitos e que os recursos financeiros disponíveis sejam utilizados em benefício da Sociedade, de forma republicana, permitindo a fruição de bens, o aperfeiçoamento da produção e geração de novos bens, a manutenção e ampliação de estruturas de difusão.

Dentro de algum tempo será voada a Proposta de Emenda à Constituição de nº 150 (PEC 150-2003) definindo percentuais fixos obrigatórios do Orçamento da União, Estados e Municípios para a Cultura.

Só para termos uma idéia, o Congresso Nacional vem gradativamente aprovando acréscimos no orçamento da União para a Cultura em volumes de dinheiro ainda aquém das necessidades (e possibilidades) reais do país. Saímos de um patamar em torno de 0,3% para 1% neste ano, o equivalente a algo em torno de 2,5 bilhões*.

Com a PEC 150, teremos, vinculado para a Cultura, 2% no orçamento da União, 1,5% nos EStados e 1% nos Municípios, sendo que o Governo Federal terá que disponibilizar parte dos valores que lhe cabe para ações integradas com os Estados. Para quem não sabe, vincular determinado valor a determinada atividade economica significa obrigar o gestor público a utilizar o recurso naquela atividade. Em acontecendo, viveremos um salto qualitativo impressionante no Brasil. Imaginemos a importância de cada municipio brasileiro ter pelo menos 1% do orçamento destinado a atividades culturais.

Há quem diga que é um absurdo obrigar o administrador público a trabalhar com recursos predeterminados para a Cultura quando há carências em várias áreas, ou que é inaceitável ver um governante não podendo colocar em prática suas idéias porque estará engessado pela vinculação do orçamento da Saúde, Educação e agora Cultura... Pois o conceito é exatamente este: evitar que determinado gestor, sem qualquer interesse por determinada atividade, faça o que bem entender com o dinheiro público.

As forças políticas que possibilitam a governabilidade são muito complexas e os interesses são os mais variados possíveis. Muitas vezes o Governante culto, com visão de futuro é obrigado a ceder nas questões orçamentárias aos interesse políticos que o levaram ao poder. Neste caso, a vinculação o protege e permite que desenvolva programas de interesse da sociedade e a favor de suas convicções. Na contrapartida, o Governante inculto ignorante também será obrigado a obedecer a lei e convencer-se da necessidade de destinar os recursos previstos para a atividade cultural que, em primeira análise, é do interesse de toda a sociedade - a grande beneficiária da vinculação. Imaginemos o aprendizado para todas as forças que compõem este xadrez.

Apesar da lei, a União, Estados e Municípios não devem se restringir a estes percentuais. Espera-se que os números aumentem na medida do entendimento dos significados economicos da atividade cultural.

É bem provável que a votação desta emenda e outras em curso esteja ainda distante, mas o processo é inevitável, pois as demandas públicas são claras, há um bom consenso entre as várias correntes políticas e, mais dia, menos dia, veremos sua aprovação.

Enquanto isto não acontece, a sociedade precisa se preparar para isto.

Discutir e propor caminhos é o objeto deste espaço.


*fonte Ministério da Cultura.

terça-feira, 16 de março de 2010

Carlos Gomes no mapa do Brasil (7)

O Visconce de Taunay, como indica o Maestro Roberto Duarte, teve uma expressiva atuação no cenário musical Brasileiro durante o Império, em paralelo a sua atividade multidisciplinar como político, historiador, engenheiro militar, artista plástico, escritor, professor e socióloco.

Além de um apaixonado pela música do Padre José Maurício, foi amigo, conselheiro e incentivador de Carlos Gomes que lhe dedicou a ópera Lo Schiavo. Não por acaso, Taunay foi quem sugeriu o tema a Carlos Gomes no momento em que o país vivia uma atmosfera acirrada de discussões sobre a abolição da escravatura.

Ao Visconde de Taunay coube ser o patrono da cadeira nº 17 da Academia Brasileira de Música ao lado de Carlos Gomes (cadeira nº 15) hoje ocupadas respectivamente pelos compositores Guilherme Bauer e Almeida Prado.

No mapa do Brasil, na Praia Grande, em São Paulo, algo por volta de 10 minutos separam os dois acadêmicos. Uma visita é fácil. Saindo da Rua Alfredo D'Escragnolle Taunay, no Trevo, toma-se a Via Expressa, entra-se à direita para a Presidente Kennedy e, finalmente, chega-se à Rua Carlos Gomes, em Cidade Ocian.

Carlos Gomes leva ao mar na Praia Grande. E em boa companhia, pois, em paralelo, lá estão as Ruas Dom Pedro II, José de Alencar, Emilio de Meneses, Monteiro Lobato, Mário de Andrade, Guimarães Rosa.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Dilemas contemporâneos da Cultura (3)

Tanzerinnen ihre Shuhe bindend - Degas
Dançarinas amarrando sapatilhas
Nosso "enigma ancestral" , como disse no último post, é como fazer para que a produção cultural brasileira seja inserida - mais do que isto - seja percebida como uma contribuição estratégica e essencial para nossa economia, com reconhecimento internacional equiparada ao que se faz nos grandes centros produtores.
As industrias criativas respondem por mais de 15% do PIB*. Se levarmos em conta o crescimento economico indicado em todas as perspectivas apontadas por respeitáveis analistas nacionais e estrangeiros, o equivalente a este percentual em moeda corrente deverá aumentar proporcionalmente de forma estupenda nos próximos anos.
Permanece o dilema. Como fazer para que os municipios respondam de forma adequada a este novo salto de desenvolvimento? Como preparar as máquinas do Estado para aproveitarem esta oportunidade de forma inteligente?
Os impactos economicos nas familias têm efeitos rápidos. As pessoas aprendem depressa a conviver com mais recursos e se inserem sem muita dificuldade no mercado de consumo.
Superada a demanda reprimida por celulares, televisores de plasma, lcd, led (qual é o melhor mesmo?), computadores, esta nova classe média buscará satisfazer suas expectativas de consumo de cultura.
Se este raciocínio lógico na aparência for verdadeiro, o Brasil viverá uma demanda muito forte de produtos culturais e, considerados os resultados do investimento que estão sendo feitos na educação, uma, no mínimo razovável, compreensão dos direitos indiividuais de acesso à cultura.
Ainda no campo das hipóteses, é razoável supor que em paralelo o cidadão aprenderá a fazer exigências proporcionais à contrapartida do voto.
Esta maldita herança das mazelas políticas escancaradas - esta a verdadeira herança maldita - dará ao País a oportunidade de um novo pacto ético.
Inspirações de Eleanor H. Porter à parte, acredito - e nisto estou em ótima companhia - que daremos certo e que a produção cultural será reconhecida como mais um motor de desenvolvimento.
O dilema persiste. Entretanto, uma pista: o voto será determinante do futuro. Portanto, senhores da política, empresários, senhores que detém o poder, preparem-se. A matriz do seu desenvolvimento passa por um novo olhar sobre a questão social e, em especial, pela ação cultural. Quem tiver respostas práticas, viverá crescendo.
Alguém duvida? Sempre haverá quem duvide. Mas, pelo que me contaram até hoje, o mundo muda por quem acredita.
*Para quem quiser e não souber onde achar, posso enviar algumas informações recentes que demonstram a fatia ocupada pelas chamadas indústrias criativas no bolo da economia Brasileira. Basta solicitar aqui mesmo no blog.

sexta-feira, 12 de março de 2010

Deus acuda! (2)

Geraldão
por Glauco*


A morte em si não me preocupa. É um processo que só nos diz respeito na medida em que possamos construí-la da melhor maneira possível dada sua inevitabilidade.

Entretanto, a morte banal me deixa perplexo e abismado. A imagem é esta: abismado, à beira do precipício onde se quer deixar instalada a raça humana.

Não dá. É penoso admitir que somos impotentes para evitar a violência.

É o trânsito que mata porque a bebida mata, a droga mata, o tráfico mata, as torcidas nos estádios matam, os maus exemplos na politicam matam, o desamor mata, a inveja mata, o desprezo pela vida humana mata.

Não mais falamos da morte pelo desespero, pela fome, pela última possibilidade. Não. É da morte trivial que nos ressentimos. Aquela morte estúpida, cotidiana que nos lembra o quanto o ser humano pode ser deplorável, ignorante, temível.

Nós falhamos. A humanidade falhou. Não sabemos lidar com isto.

Estamos todos à beira do abismo, border line e a chance prática é a intervenção sistemática do Estado, irreversível, sem negociação, preservando os Direitos da Pessoa, mas batendo pesado com as ferramentas que o planejamento, a tecnologia colocam à nossa disposição. Não dá mais.

Mortes como a do Glauco, quaisquer que sejam as motivações, só podem ser a exceção, da exceção, da exceção e, mesmo assim, olhe lá.

Não dá mais para aceitar que algumas dúzias de marmanjos usem o esporte para brigar. Ou que um imbecil qualquer de cara cheia faça o que quiser com um carro. Ñão dá mais morrer por causa de trocados, ou por um par de tênis, por uma bobagem qualquer.

Já nos basta a boa morte, a que vem anunciada sem dizer quando.

É tempo de recolhimento, de prece no credo de cada um. Tempo de mudar a frequência. É tempo de fé.

*O cartunista Glauco Villas Boas (Glauco -1957-2010) foi assassinado na sua residência hoje, 12/03/2010, por dois homens.

quinta-feira, 11 de março de 2010

Carlos Gomes no mapa do Brasil (6)

Carlos Gomes

Próximo ao Hospital São Lucas, na cidade de Diadema em São Paulo, na Rua São Jorge, 160, fica o Estopim da Fiel, sede de torcida organizada do Corinthians, onde os torcedores, entre outras coisas, podem compar os ingressos do próximo jogo do "Timão".
E o melhor de tudo isto é que não muito longe dali fica a Rua Carlos Gomes: uma ruazinha pequena, mas que não deixa de ser o registro da homenagem ao compositor.
O que pouca gente sabe, entretanto, está na nota que me enviou o Maurício Chiavatta, de São Paulo.
Segundo consta na história do time de futebol, 13 pessoas sacramentaram a fundação do Sport Corinthians Paulista. Entre elas Miguel Bataglia, um alfaiate de renome à época e o primeiro presidente. Lá no bairro do Bom Retiro, ainda à luz de lampião de gás, o grupo discutiu meia dúzia de nomes para o novo time que surgia. Entre as idéias, passaram por Santos Dumonte , vejam só: Carlos Gomes e até Guarani (o título da ópera mais famosa de Gomes).
Por sugestão de José Ambrósio (um dos 13 fundadores) decidiu-se homenagear o famoso time inglês Corinthian Football Club que excursionava no Brasil. Assim mesmo. Corinthian sem "s". Como a torcida e a imprensa chamavam a equipe de "Corinthian's Team"...
De qualquer modo, por pouco um dos times de futebol mais populares do Brasil não se chamou Carlos Gomes.