Máscara "A ópera em São Paulo hoje"- por CP
Reflexões sobre as consequências e as inconsistências do que
representa a acusação de desfalque de R$18 ou R$20 milhões do orçamento do
Theatro Municipal amplamente difundida pelos veículos de comunicação em
reportagens recentes. Qual a sua origem, seu significado e efeitos na percepção
pública da nossa categoria?
Parte I
Sem dúvida, há um contrassenso nos perseguindo.
Nós diretores, regentes, cantores, músicos, atores,
bailarinos, cenógrafos, designers – artistas da ópera – deveríamos ir ao teatro
iluminados pela sóbria alegria do trabalho (expressão que tomo emprestada de
Merleau-Pointy).
No entanto, há três anos um sombrio desprazer nos envolve
quando se fala do Theatro Municipal de São Paulo.
Criadores foram sistematicamente afastados e as consequências
desta atitude não serão de fácil reparação. Instalou-se
um modelo em curso indesejado e perdulário.
Sob uma retórica inaceitável alega-se: 1) A casa já possui
vários artistas nacionais; 2) Gera empregos com remuneração elevada; 3) O
presente organizou o passado (como se fosse desajustado); 4) Finalmente o pior:
justificam-se as ações em curso como uma promoção do denominado teatro a uma
maravilha mundial.
Quanto aos empregos e artistas da casa, como se diz no
jargão, nada a subtrair. Afinal, é de se
esperar que assim seja num teatro que pretende ser capaz de traduzir em
conteúdo as expectativas culturais de uma sociedade que sequer sabe
concretamente o que lhes é de direito nesta matéria. Uma sociedade que entre
leigos e versados, laicos e devotos, muitas vezes se protege criando um
arrazoado de opiniões e princípios guindados à condição de absolutos, mas que,
no fundo, são resultado apenas da falta de referências em situações extremas
como as que acontecem neste horroroso momento histórico, do exercício de certo
olhar para si, para um pouco do que se faz “lá fora”, para seu entorno, para
sua cultura.
Não se viabiliza nenhum processo cultural de fora para
dentro, pois afinal não é a Cultura a maneira de se trazer o diferente à luz?
Não é a Cultura a manifestação mais prudente das forças que compõem a memória,
a maneira de se perceber, a forma como se relacionam as pessoas na sua
comunidade, e por extensão na sociedade inteira? A mecânica natural do processo
de desenvolvimento Cultural não é tratar o externo como referência para se
proteger e se projetar o que é próprio?
Pois bem. O incomodo e toda sua lista de sinônimos, o
desagradável, o embaraçoso, o constrangedor, o impróprio, o descabido, é
exatamente esta incapacidade de se produzir conteúdo, nesta visão estreita que
se recusa a compreender – a querer compreender – que tudo o que vem sendo feito
está errado, não interessa à Cultura Brasileira, não é a maneira adequada de se
conduzir artisticamente a ópera nesta cidade superlativa, não pode ser nesta relação
de custos, que algo está errado, algo está muito errado, algo está
insustentavelmente errado.
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