sexta-feira, 14 de maio de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (23)

Orquestra de Ópera
Edgar Degas

Em minha opinião, iniciou-se um debate interessante nestes Dilemas. Ver comentários em Dilemas Contemporâneos da Cultura (22).

Para ampliar um pouco mais, proponho uma analogia nascida da reflexão sobre uma conversa que também tive há poucos dias com alguns amigos sobre as diferenças entre cultura erudita e popular.
O artista é um ser humano diferente e isto não o torna melhor ou pior. Apenas é diferente, por seu trabalho - a arte em si - e pela forma como se expõe.
Muito embora o trabalho artístico seja essencialmente trabalho, não podemos ficar nesta leitura rasa de que é trabalho como outro qualquer.
Não dá para achar que os músicos de uma orquestra são um monte de operários(*) sentados à frente de estantes, trabalhando sob o comando de um operário-chefe com um bastãozinho agitado no ar. Isto não tem nada a ver com o fato de músicos serem contratados dentro de regras comuns às categorias profissionais no mercado de trabalho.


De fato, para o artista profissional aqui entendido como aquele que vive da sua produção artística e dedica a ela a maior parte do seu “tempo de trabalho”, a sua relação com as lides artísticas devem, na maioria dos casos, ter suas rotinas como em qualquer atividade. Ou seja, há uma fase de árdua dedicação para que sua arte se conclua ou esteja em ponto hábil para exibição pública.

Por outro lado, o método e a circunstância em que a produção artística acontece possuem elementos que evidenciam uma natureza diferente para este tipo de atividade. Neste terreno fértil, intuição, percepção, emoção, risco passam a ser constitutivos da natureza do trabalho artístico.

Desde a revolução burguesa na França no final do século 18, os artistas passaram a viver de criar o que julgavam “bom” e a procurar aquele que se interesse por seu trabalho. A sua relação com o mecenato mudou de uma confortável dependência em que os “patrões” diziam o que e como queriam, para uma circunstância em que as regras passam a ser da incerteza econômica e outros níveis de dependência, sem perder os elementos naturais da produção citados acima.

Estas novas relações são determinantes de um novo modelo em justaposição a uma dinâmica de mercado.

É preciso entender isto claramente. Cabe ao gestor o papel de compreender esta natureza e apoiá-la como um suporte de conexão à realidade.

Volto ao tema.

(*) Antes que digam que sou preconceituoso com os operários, entendo operários como sendo membros de uma categoria profissional que executa trabalhos manuais, de forma remunerada, para um empregador, transformando matérias primas ou, tendo conhecimentos técnicos de um determinado ofício, atua com materiais que lhe são fornecidos em vários graus de especialização.

Um comentário:

  1. Buenas.

    Nao quero gerar nenhum tipo de atrito aqui, apesar de achar tb. que esta discussao é boa.
    Acho sim que somos todos operários, em favor de uma mesma causa, ou de muitas que dependem uma da outra.
    Acho que só partir do momento que a Arte, Cultura seja vista como normal será esta vista tb. como imprescindível (nao sei se escreve assim).
    Impressindível (segunda tentativa) como sao tantas coisas normais na nossa vida da quais nem tomamos mais conhecimento ou damos valor.
    Os melhores papos(conversas) que tive até hoje sobre música ou Arte em geral foram aqui com pedreiros, carpinteiros, azulejeiros etc. Nao porque eu sabia mais sobre o assunto, mas simplesmente porque eles tb, queriam saber algo e vice versa. Quase sempre fui eu que aproveitei mais as conversas para as reformas da minha casa feitas por mim mesmo, e isto nao tem nada a ver com interesse, é só uma questao de querer ouvir um pouco e aprender. Acho que tb. ajudei com dicas...
    Semana passada li mensagens num rolo de papel higiênico em Veneza, melhor nem comento...
    O artista está sim sempre exposto. Estes dias ainda discutia(papeava) com um colega de camarim que é Kammersänger.
    Sempre quando estás no palco estás sim sendo avaliado em 100%, a pressao é grande, o stress é forte, mas tu estás preparado para isto, e fazê-lo tu lo faz por vontade prórpria e por teres suado muito para isto.
    Acho aliás que talento talvez tenha o peso de 10% na carreira de um artista, todo o outro resto é suor, e isto pouca gente sabe.
    Do que te vale um Steinway em casa se nao suares na frente dele?
    Quanto ao Mecenato, aqui no caso o Estado ou Cidades (eu por ex. sou funcionário do Goverrno Alemao), ditam sim e vao ditar sempre. Se tu estás de acordo com isto ou nao é uma outra questao.
    Ano passado entrei em uma discussao aqui (nao era papo) com o Regisseur que encenou Don Carlo e que fez uma grande merda.
    Arrisquei perder o meu trabalho quando escrevi para a Direcao do Teatro dizendo que nao queria cantar o Filippo II, explicando e justificando o porque; papel que todo baixo sonha cantar. Mas aí volto de novo pro comeco da minhas viagens aqui (desculpa gente nao to muito acostumado a escrever ainda bem que nao ßé de punho).
    Me considero um operário sim, a servico, em primeiro lugar,da música.
    Inté

    ps.
    oxala um dia marketeiros se darao conta de como vale a pena investir em Cultura.

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