sexta-feira, 23 de abril de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (15)

Detalhe do painel externo Teatro Nacional de Brasilia
foto Augusto Areal

Todo teatro projetado por Niemeyer é sinônimo de encrenca. Não se trata de demonizar o nosso ícone, mas de nos rendermos a um fato.

A impressão que se tem é que Niemeyer sempre quis punir os artistas criando as mais controversas formas de ocupação dos espaços de back stage. Este descaso com o projeto em si - com a ocupação do espaço e as necessidades - é parte do notório saber do centenário e admirável criador.

Mas não pensem que este texto é um manifesto pró-licitação de novos arquitetos, ódios mortais ou coisa que o valha. Não se trata disto.

O que estou pondo em discussão é a necessidade óbvia de envolvimento de profissionais que irão ocupar um determinado teatro ou que pelo menos sabem prever quais as necessidades de um espetáculo de dança, de ópera, de teatro, de música popular, música de câmara ou coisa que o valha. São espetáculos diferentes com necessidades diferentes. Este envolvimento precisa ser permanente, do projeto à conclusão da obra.

Lembro-me que certa feita, fui ao Teatro Pedro Ivo em Santa Catarina. O projeto previa um fosso de orquestra com o piso do palco sustentado por uma viga. Não é que na obra, a engenharia colocou uma coluna bem no meio do fosso? Os maestros que se adaptassem a dirigir orquestras com uma coluna de 40 centimetros na sua frente, entre ele e a orquestra.

Isto significa que o arquiteto nem sempre é culpado. Agora, aqui entre nós: a culpa é do engenheiro? De quem detalhou o projeto? Ou é do processo como as coisas são institucionalizadas?

Não seria o caso de se conversar a respeito com os profissionais que atuam na área, ou que pensam os problemas de ocupação? Afinal, qual arquiteto no Brasil, engenheiro, mestre de obras, comprador, secretário de cultura, governador, irá lembrar - ou, maioria dos casos, saber - que é necessário ter um sistema de som interligando palco e camarins para avisos gerais? Ou que é necessário revestimento lavável nas paredes dos camarins, pois maquiagem no corpo suja? Ou que carga precisa ser descarregada perto do elevador montacargas ou do mais fácil acesso ao palco?
Volto ao tema.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (14)

Construção da Ópera de Sidney - Austrália
foto by Max Dupain

Não me lembro de um técnico ou artista que tenha elogiado o resultado final de um teatro projetado por Oscar Niemeyer. Aliás, de um modo geral, não há quem não reclame da maneira como os teatros são construídos no Brasil.

É voz corrente que se privilegia a construção de um novo equipamento sem que haja uma preocupação com equipá-lo adequadamente. De fato, a maioria dos teatros realizados pelo poder público são "concluídos" sem que lhes seja dada a condição adequada para ocupação e as desculpas são as mais variadas. Basta saber, por exemplo, que o teatro é construido sem o desenvolvimento de um plano de negócios, ou um plano de ocupação.

Como se dá o processo de construção?

O governante quer um teatro seja por que razão for. O primeiro passo é contratar um projeto - preferencialmente sem licitação por notória especialização e garantir os recursos gerais para a obra.

Aí estão os primeiros entraves. Não interessa discutir proposta de ocupação, necessidades artísticas, porque na cabeça da maioria dos gestores está se fazendo uma obra e não um espetáculo. "Obra é obra": projeto, cimento, visibilidade e inauguração com um show. Não interessa do quê, nem como.

Voltarei ao tema.


quarta-feira, 21 de abril de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (13)

L'Opéra Paris Garnier
Frank Meyers Boggs
Democracia não é fácil.

O processo democrático é mais demorado. Evitando a saída fácil da metáfora, mas optando pela analogia adequada, a democracia, como toda edificação, constrói-se pela base. Isto significa que este dificil exercício do diálogo deve nortear as relações na atividade Cultural.

A possibilidade de se construir políticas Culturais adequadas sem a consulta prévia aos artistas que de fato exercem as atividades específicas é praticamente nula, pois o projeto deve nascer destas relações construídas por intermédio de indivíduos e também de entidades com caráter associativo.

Se entendemos que políticas e seus programas são necessários a partir do poder público, também devemos imaginar que estas atividades têm como fundamento a busca de sustentatibilidade para não cairmos também na triste constatação de que ao se construir um Estado que tudo deve nada mais estamos que fortalecendo aquele que tudo pode.

Também não devemos cair no erro de que sustentabilidade seja ausência de participação do Estado no financiamento da Cultura. Há programas que não fecham a conta e não fecharão jamais, sendo no entanto, imprescindíveis. 

Sustentabilidade está muito mais associada à garantia de direitos do Cidadão e à garantia do exercício saudável da produção Cultural.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Carlos Gomes no mapa do Brasil (13)


Amanhã, dia 21 de Abril, Brasília completa 50 anos.
Em depoimento, Juscelino Kubitscheck relatou que a pergunta de um advogado num comício em Jataí o levou a refletir sobre a necessidade constitucional de construir uma nova cidade para abrigar a capital federal e a prometer imediatamente que faria a obra.


Assim, diz a história, nasceu a idéia de fazer Brasília que ganharia o projeto urbanistico de Lúcio Costa sobre um "x" marcado no solo do plano central. Uma cidade em cruz que ganharia as curvas inusitadas de Oscar Niemeyer e mobilizaria milhares de homens e mulheres na sua construção.


Brasília nasceu sob o signo de um olhar central sobre o país onde até hoje as desigualdades ainda são tantas. Se conseguimos reduzir a perspectiva surda da pobreza intolerável e avançamos para o crescimento economico nestes anos de democracia é um grande avanço.
Fica sempre a questão de como transmitir ao jovem a história e permitir-lhe a visão crítica para que possa reconhecer as limitações, qualidades e viabilidades do seu país.


A política é um fiel condutor dos equilibrios. Em Brasília, no Distrito Federal, ou numa pequena cidade do Rio Grande do Norte, um belíssimo Estado. A cidade de Natal tem vários municipios próximos. Entre eles São Gonçalo do Amarante, uma cidade de grande fé religiosa a ponto de ter 42 santos padroeiros.


A assessoria* do Prefeito Municipal manda para o blog a informação de que na esquina da Rua Carlos Gomes com Rua Aurora instalou-se no último final de semana um evento multidisciplinar que envolveu todos os organismos municipais, realizando várias atividades e inclusive oficinas culturais - uma delas que serve de mote para a foto desta semana.


Se por um lado neste evento o prefeito Jaime Calado conseguiu que algumas pessoas pudessem dar adeus à casa de taipa e passem a morar em casas de alvenaria, temos aí, sem dúvida, um grande avanço social, e, de outro, se adultos e crianças, identificam na Rua Carlos Gomes um ponto de aprendizado e entretenimento, ganhamos pessoas mais conscientes de seu papel de cidadãos.

Fica aí o recado e proposta para o Gleydson de Almeida, diretor do Teatro Municipal, não esquecer do compositor, da sua obra, da música erudita, numa cidade tão musical e tão lindamente romanceira com Dona Militana (http://www.saogoncalo.rn.gov.br/cultura_donamilitana.php). Quem sabe dia destes não nasce uma nova ópera brasileira baseada nestes cantos de memória, da nossa memória armorial, desta mistura fantástica de princesas, guerreiros, batalhas que compõem a rica musicalidade nordestina?

*agradecimentos ao Daniel Cabral - Secretário de Comunicação e a seu assessor Ledson França.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (12)

Antes do Ballet
Pierre Carrier-Belleuse


Uma das coisas mais complicadas é a garantia das liberdades individuais e na Cultura esta é uma das questões mais complexas.

Tenho refletido bastante sobre o papel do artista e do indivíduo quando se vê ferido nos seus direitos individuais.

Os problemas são enormes e diversificados com sofisticações específicas em cada área. Artistas são afetados por coisas elementares como pagamentos de cachê, o cancelamento de contratos sem a justa contrapartida, problemas com agentes e bizarrices das mais diversas que vão da falta de seguro por acidentes a audições de cantor por skype como corre à boca chiusa aqui e ali.

Está posta a questão. Como institucionalizar a atividade artística de modo a que as relações se dêm de forma clara, transparente, séria, profissional, sem que o artista precise silenciar sob pena de não mais ser contratado, de ser tratado como inimigo? Como fazer para que o profissional de qualquer área da Cultura seja respeitado e tenha voz, sem a necessidade de se submeter, de ser bonzinho, silencioso, cordial?

Numa sociedade "moderna", para este Brasil que virá, precisaremos enfrentar esta questão e afastarmos definitivamente a falta de ética, de profissionalismo, de respeito. Não parece chegada a hora de se buscar uma resposta para isto? De termos Instituições sólidas e adequadamente fundamentadas?

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Dilemas Contemporâneos da Cultura (11)

Ensaio de Ballet
por Degas
A kombi tinha pelo menos uns 8 anos de estrada com alguns remendos, a lataria com algumas manchas. No vidro traseiro uma plaquinha gaiata: É velha mas tá paga.


Aproveitando o humor, a história bem se aplica ao conceito de produção de ópera. Sempre se fala que a ópera é um espetáculo caro, mas se levarmos em conta que uma determinada produção será montada e apresentada nos 10 anos seguintes, o custo inicial fica muito diluido e representa, em termos relativos, um custo muito baixo.


O mesmo se aplica a outras atividades e por isto o gestor de Cultura deve ter uma visão abrangente do processo.


Infelizmente, isto ainda não acontece no Brasil com a frequência desejada. Com isto perdemos em velocidade já que o díálogo se torna mais dificil e muitas vezes sujeito a equívocos.


O dilema, portanto, está na necessidade de aperfeiçoamento de gestores para área com a criação de cursos específicos que auxiliem na identificação de peculiaridades administrativas, técnicas e artísticas da Cultura, principalmente considerando que em todo o país temos apenas dois ou três cursos de perfil acadêmico.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Carlos Gomes no mapa do Brasil (12)


Capa da edição em português da ópera O Guarani

A origem dos nomes é sempre uma coisa curiosa.

É muito natural imaginar-se que certo Sr. Vicente Sabará Cavalcante proprietário do seringal Ouro Preto lhe tenha dado o nome da cidade Mineira de Ouro Preto até por levar no seu próprio a referência a outra cidade também de Minas Gerais. Natural, claro, mas a história ganha outra possibilidade se olharmos a região de Ji-Paraná, no Estado de Rondônia, onde fica a Serra do Ouro Preto, assim denominada por causa de umas pedras pretas características da região.

Factível portanto, que a Cidade de Ouro Preto do Oeste tenha assim sido denominada mais por causa das pedras, da Serra e menos por causa do Sabará ou mesmo da Ouro Preto Mineira.

Além desta pequena referência deste Brasil tão distante da sala onde escrevo este blog, o bom disto tudo é saber que quase no perímetro do traçado impecável das ruas de Ouro Preto do Oeste, está a Rua Carlos Gomes, mais um lugar de memória da ópera.