OTA - Grafite sobre tela
A arte está sempre associada a ato humano, sendo este
conceito amparado pelas doutrinas clássicas e intelectuais do fazer.
Ars est recta ratio
factibilium. A Arte é o exato conhecimento do que se deve fazer. Esta definição quase tão antiga quanto
a Arte, serve ao propósito de lembrar que a arte é um ofício, mas está distante
da maneira como a reconhecemos hoje e como a percebemos como uma fruição
estética, de vazão intelectual e de reflexão tanto de quem a produz, quanto de
quem a consome.
O OTA das quebradas, que não arreda pé – ainda bem – de
trabalhar com a moçada na periferia da periferia e de trazer à luz um monte de
jovens criadores. O OTA dos grandes murais. O Doutor Ota daqui a alguns poucos
dias. O Otavio Fabro da Faculdade, o Otaviofabroota do Instagram, Otavio Fabro
Ota do Facbook e um monte de OTAs e Otavios em tanto canto que nem ele, nem
ninguém precisam saber onde está, porque a arte é assim também: das paredes
para as cabeças e corações sensíveis.
Autodefinido “O eu
grafiteiro/artista/pesquisador” em exposição* com este título, Otavio Fabro OTA – o Doutor Ota – conseguiu em uma
sala com 10 telas, objetos de madeira e concreto, monitores exibindo seu
processo de trabalho e pequenas telas com ilustrações a traço, apresentar a
gênese do Grafite.
Ainda um tema controverso, OTA conta em poucas palavras e muitas pinceladas o que é grafite. E faz isto
com muito bom humor. Tapas de ironia. Melhor dizer afagos de ironia refinada,
um sarro bem tirado que demonstra ser
o grafite uma intervenção urbana necessária, além do flácido senso comum que
nega a sua importância.
A partir de madeira, que trabalhou mecanicamente com um
resultado espetacular associando-a ao concreto, OTA introduz o carvão,
resultado da queima do material original.
A tela central é negra. Melhor. É grafite. Precisa falar
mais alguma coisa? Pedacinhos de carvão dispostos sobre tela. Ao lado, mantendo
a proporção áurea das telas que poderiam se abraçar num único painel em relevo,
OTA pinta uma tela com tinta de fuligem. Isto mesmo. Fuligem. Aquela coisa
negra que flutua no ar, suja os colarinhos brancos dos executivos da Paulista
ou de Wall Street, e cobre carros, placas, cabeças, calçadas, cestos de lixo,
bancas de jornais, homens, mulheres, crianças, bancos de jardim com uma
película teimosa, finíssima, diária. Mais adiante, uma tela é um pedaço de rua
(tinta asfáltica sobre tela. O conhecido piche. Picho?) com um buraco. Isto
mesmo: uma depressão côncava que entorta roda de magrela, principalmente quando
tem tantos buracos nas ruas que até merecem uma tela do OTA.
Em outro canto,
outra tela com asfalto e se você olhar de perto verá que a textura é a mesma do
asfalto (quem jogou bola na rua, sabe. Quem anda a pé e observa, também). Nesta
ele brinca com um spray, que não podia faltar numa exposição de um grafiteiro.
Lá está a faixa branca no meio do asfalto com um sfumato típico da técnica, nada mais que um dos cânones da Renascença,
só prá lembrar que grafite é coisa de erudito que não gosta de ser chamado
assim.
(*) a exposição “O eu grafiteiro/artista/pesquisador”
encontra-se no Instituto das Artes da UNESP – na R. Dr. Bento Teobaldo Ferraz,
271 - Barra Funda, São Paulo, até o dia 19.05.2018